COLUNA DO TIMM
Editorial
DONALD TRUMP: 2025-2028
Biden está se despedindo do Governo e da vida púiblica. Nesta quarta faz seu balanço de governo no Salão Oval da Casa Branca. A derrota de sua candidata à Presidência deixa o recado de que não bastam indicadores econômicos bons para o sucessoi eleitoral. Os grandes números da economia americana até eram bons mas não suficientes para assegurar a vitória democrata. Um bom crescimento e uma baixa taxa de inflação nem sempre chegam aos ouvidos e bolsos dos eleitores. Vide não só Estados Unidos, também o Brasil de 2024...
E aí vem o Trump, o “bull shitter”, falador de m... , criminoso condenado por fraude fiscal, com sua trupe de magnatas curvados ao seu extremismo, já desalinhada. Já é um filhote da Era de Infocracia. Fala muito, não diz nada, não tem um claro Programa de Governo, mas “tecla”, tecla muito no X e nas Redes. Governa através destes pirulitos diários onde destila ódio a imigrantes, liberais, aos quais acusa de comunistas, e à cultura em geral. Faz sucesso Musk ameaça democracias europeias, diz Financial Times. Ele já enfrenta, também, críticas de lideranças europeias e Steve Bannon, guru extremista, promete expulsá-lo do Governo e o chama de maligno
Professor avalia que disputa de influência e interesses pode gerar conflitos entre Elon Musk e Donald Trump
Steve Bannon chama Elon Musk de “maligno” e promete expulsar o bilionário do governo Trump
As previsões do Governo Trump ainda são incertas e contraditórias. Poucos apostam no seu sucesso, embora tampouco acreditem que outrora vigoroso Partido Democrata esteja preparado para substituí-lo daqui a quatro anos. O Partido se enredou nas plataformas identitárias e perdeu muito de sua força junto aos sindicatos. Não tem também uma liderança nacional de peso. Kamala, no fundo, foi uma decepção. Não foi, nem estava preparada para o desafio. Vamos ver com o tempo, quem emergirá. Do ponto de vista econômico, Trump se voltará a seu slogan MAKE AMERICA GREAT AGAIN. Vai forçar as grandes corporações a retornarem à Casa Materna – USA -, o que, além de muito difícil, já que as cadeias de produção se estenderam ao mundo inteiro, inclusive na fronteira próxima do Canada e México, daí a ideia de transformá-los em Estado Membro, seria extremamente caro, portanto inflacionário. Mas Trump insiste na retórica da taxação elevada sobre importados como estratégia de reindustrialização, sem nenhuma visão de futuro. Só passado. Passado mitificado e mistificador. Feito o corvo que bica o pescoço da águia que o sustenta no vôo, na tentativa de controla-la, mal se dá conta que a águia poderá subir mais alto ainda derrubando-o ao solo por falta de oxigênio.
Quem viver, verá...
Editorial
AINDA ESTAMOS AQUI!
Paulo Timm – Publ. A FOLHA, Torres – 10 jan/ 25
Aprendi com meu contemporâneo da Faculdade de Filosofia da UFRGS, idos de 60 do século passado, João Carlos Brum Torres, uma passagem de I. Kant, Filósofo do Iluminismo, sobre a diferença entre um evento e um acontecimento.
"Em O Conflito das Faculdades, depois de perguntar Se estará o gênero humano em constante progresso para o melhor , Kant acrescenta que só se poderá responder positivamente a essa interrogação se a experiência nos apresentar "um acontecimento que aponte”, ainda que “de modo indeterminado quanto ao tempo", nossa "aptidão para sermos causa do progresso", permitindo, assim, "inferir a progressão para o melhor (....)." Um tal acontecimento, acrescenta Kant, deverá ser tido então “como signo histórico", um signum rememorativum, demonstrativum, prognostikon"
João Carlos Brum Torres in “As eleições americanas de 2016 como sinal histórico”
Setembro de 2016
Com efeito, o acontecimento é uma espécie de epifania, um feito de caráter transcendental que concelebra um, antes e outro, depois. Como a datação do calendário: AC e DC; ou a Revolução Francesa. Assim foram, por exemplo, no Brasil, nas últimas décadas, o suicídio de Vargas, em 1954, a Legalidade no Rio Grande do Sul em 1961, o comício de Jango na Central do Brasil dez anos depois, a passeata dos cem mil, no Rio de Janeiro, em 1968, o cadáver de Vladimir Herzog nos subterrâneos da repressão em 1975, o foto de Ulysses Guimarães no dia da promulgação da Constituição em 8 de outubro de 1988, as mobilizações massivas de junho de 2013. Marcos. Pois, tendo eu vivido de perto todos estes momentos, ouso dizer que pressinto no Prêmio Globo de Ouro da Fernanda Torres, neste início de 2025, pela sua atuação no filme “Ainda estou aqui”, um desses momentos. Em nenhum deles, acima citados, grandiloquentes, no passado, há um protagonista exclusivo, embora haja uma persona que o sintetize. Eles resultam, cada um, de um processo que, num dado momento, eclode. É célebre, aliás, a defesa de Leon Trotski, quando acusado pelos tribunais do Czar russo de ser o responsável pela revolução de 1905. Disse ele: - Ninguém faz uma revolução, elas “acontecem”. Todos os eventos, acima citados, também aconteceram, no sentido de terem se desenrolado como produtoS de um conjunto de forças históricas objetivas e subjetivas. Pois é isso que está “acontecendo” com o filme “Ainda estou aqui”. Nem é um grande filme para entrar na galeria dos clássicos do cinema. Talvez seja um Poema sem Poesia, mas comovente como um cordel da Maria Degolada. Muitos, até, o criticam por trair uma espécie de selo Globo, impregnado de andamento novelesco. Seria, até, o caso de se perguntar: - E daí? Qual o problema? Não são ditas novelas construídas sob a égide da Poética Aristotélica, com início, meio e fim amorais? Ou, por acaso, preferiram “Metrópole”, do Coppola? Verdade, é , mais ou menos, como aquele “rio que passa pela minha aldeia”, ou como as tolas cartas de amor estigmatizadas, também/ por Fernando Pessoa. Mas este filme “nos” diz respeito. Não é um “filme autoral”, mas íntimo. Vi muita gente dizer que viu e chorou. Eu também. Tem, aliás, uma interpretação magistral, em preto e branco, de uma atriz nada performática, Fernanda Torres, que nos conduz para uma empatia com a personagem que interpreta, remetendo-nos, pelo afeto, às sombras do regime que se quis perpetuar recentemente sob a égide insidiosa de saudosos do regime militar. Dizem que uma imagem vale por mil palavras. Digo eu, este filme vale por mil discursos. Diz tudo, sem dizê-lo. Coincidiu, curiosamente – ora direis ouvir estrelas! – com a divulgação de uma Pesquisa de Opinião na qual 87% dos brasileiros dizem preferir a democracia, condenando os distúrbios do 8 de janeiro. Não por acaso, nestes dias, o Supremo Tribunal Militar remete para o julgamento civil do Supremo Tribunal Federal o processo incriminando vários coronéis por haverem incitado ao golpe no final de 2022. Desconfio que o “Aindo estou aqui” está operando magicamente para pavimentar o caminho que nos levará a retomar a História em 2026, soterrando o fantasma do retrocesso. Tal como em 2002, como advertiu o historiador Eric Hobsbawn, estamos navegando contra a corrente ocidental e, pelo nosso peso no Sul Global, contribuindo, mais do qualquer outro país do lado de cá do Equador, para a distensão do mundo.
Não é isso um “acontecimento”?
Oressa Gonzaguinha! Ainda estamos aqui!
"Eu quero mais é me abrir e que essa vida entre assim
Como se fosse o sol desvirginando a madrugada
Quero sentir a dor dessa manhã "
Editorial
Consequências econômicas de Trump 2.0 - Simon Johnson
As consequências econômicas do Trump 2.0 by Simon Johnson - Project Syndicate
Trump está herdando uma economia forte, mas suas políticas mais emblemáticas farão quase nada de positivo pelos trabalhadores menos escolarizados ou melhorarão significativamente a vida da maioria dos americanos
O segundo governo de Donald Trump começa ao meio-dia de 20 de janeiro. Sua campanha eleitoral ininterrupta desde que perdeu para Joe Biden em 2020 sugere uma reformulação mais bem organizada de seu primeiro mandato, com o mesmo foco nos cortes de impostos para estimular a economia, tarifas mais altas para reformular o comércio dos EUA com o mundo, e a deportação do maior número possível de imigrantes para gerar mais oportunidades para os trabalhadores americanos. Mas os tempos mudaram e é improvável que a realidade corresponda à retórica.
Em 2016, quando Trump conquistou a presidência pela primeira vez, os EUA experimentavam um período prolongado de inflação baixa. O Federal Reserve (Fed) manteve as taxas de juros próximas de zero ao longo de todo o seu governo. Mas desta vez, é bem diferente. A inflação disparou durante a pandemia, e o Fed ainda está em guarda contra um ressurgimento - daí as taxas de juros permanecerem relativamente altas. Os cortes de impostos propostos por Trump implicam um estímulo fiscal para uma economia com baixo nível de desemprego. Qualquer sinal de superaquecimento será enfrentado por uma política monetária ainda mais apertada.
Trump fez barulho sobre mudar a liderança do Fed, mas ele não pode demitir seu presidente, Jerome Powell, sem arriscar incorrer em taxas de juros de longo prazo mais altas e inflação mais alta. Haverá corte de impostos em 2025, principalmente para as pessoas ricas, e a consequente perda de receitas vai minar a sustentabilidade fiscal de longo prazo. Déficits maiores manterão os juros mais altos do que de outra forma eles seriam, e o dólar poderá se fortalecer, criando dificuldades para os exportadores americanos e para os países que têm empréstimos em dólares.
Sobre as tarifas, os líderes mundiais (e os mercados financeiros) entenderam que Trump fala alto e carrega um porrete bem pequeno. Ele sem dúvida imporá ruidosamente algumas tarifas de alto perfil, mas os interesses das empresas americanas começarão a procurar brechas e fazer lobby por exceções. Líderes estrangeiros farão peregrinações a Mar-a-Lago, jogarão golfe e negociarão exceções mútuas (não taxaremos seu bourbon, se você não taxará nosso conhaque, e compraremos mais sistemas de defesa aérea dos EUA).
Trump poderá ignorar todos esses apelos e insistir em tarifas mais altas em todos os setores. Mas isso resultaria em mais retaliações e mais protestos de grandes empresas que hoje o apoiam. A última coisa que Trump quer é causar perdas de empregos em casa, o que poderá acontecer se empresas baseadas nos EUA tiverem que pagar mais pelas importações e perder competitividade nos mercados exportadores. Se os líderes estrangeiros não o fizerem parecer mal no campo de golfe e enfatizar os empregos que suas empresas criam nos EUA (especialmente nos Estados controlados pelos republicanos), tudo estará aberto a uma discussão razoável.
O que os eleitores americanos realmente se importam é com bons empregos e com o custo de vida baixo. Mas a agenda “populista” do presidente eleito - um programa de ilusão sustentado pelo medo de inimigos imaginários - é um fracasso anunciado
Sobre a imigração ilegal, Trump certamente terá impacto. O “muro da fronteira” é uma ilusão sem significado real. Mas Trump já ameaça punir o México e outros países (até mesmo o Canadá) com tarifas elevadas e outras medidas, a menos que eles contenham os imigrantes, e isso terá algum efeito. Trump poderá também ser inteligente o suficiente para relaxar as sanções dos EUA contra a Venezuela, permitindo mais petróleo no mercado mundial e também ajudando a economia venezuelana. Isso reduziria a pressão sobre os venezuelanos para emigrar, ao mesmo tempo em que pressionaria o Irã e a Rússia (ambos dependentes das vendas de petróleo para financiar compras de componentes eletrônicos da China para uso em armas).
Trump poderá ir mais longe e reunir e deportar milhões de pessoas que estão nos EUA ilegalmente. Mas uma deportação em massa prejudicaria grandes setores da economia (como o agrícola e o da construção), alimentaria uma enorme perturbação social e levaria seus aliados empresariais a cortar seus investimentos (e a criação de empregos). Mais uma vez, devemos esperar ver grandiloquência política e manchetes sensacionalistas, mas a realidade não mudará muito (a imigração ilegal já caiu).
Então, o que Trump realmente fará? Ele comprará a Groenlândia (ou o Canada!), ou de alguma forma readquirirá o controle sobre o Canal do Panamá ou reduzirá o apoio dos EUA à Otan? Nenhuma das declarações recentes de Trump sobre esses assuntos é sem sentido, mas elas também não devem ser levadas ao pé da letra. Mais uma vez, Trump quer obter o que ele considera (e o que ele pode retratar como) um acordo “melhor” para os EUA. Se ele não disser o que isso significa agora, significa apenas que ele está aberto a sugestões - ou ele pode simplesmente definir o que quer que seja o ponto final como uma vitória estratégica.
Foi o que aconteceu durante o primeiro governo Trump, quando o Nafta foi renegociado com o México e o Canadá. Trump inicialmente ameaçou rasgá-lo “no primeiro dia”. Mas ele acabou se contentando com pequenas modificações (incluindo a alteração das regras de origem de uma maneira que fosse aceitável para todas as partes) e um rebranding que o transformou no USMCA.
Uma reformulação mais ampla do mundo está em andamento, mas isso não tem nada a ver com o novo governo, que provavelmente não responderá de forma eficaz. Por exemplo, Trump ainda usa uma linguagem belicosa sobre confrontar a China e o Irã, mas ambos já se encontram em más condições econômicas e dificilmente representariam uma ameaça à ordem regional - muito menos à paz internacional. E, como fez em seu primeiro governo, Trump promete se retirar de intervenções estrangeiras (Afeganistão e Iraque antes; Ucrânia agora). Mas a necessidade que a Rússia tem de drones e mísseis para lançar contra a Ucrânia tornou o presidente Vladimir Putin totalmente subserviente à China. Será que Trump (e o Congresso republicano) realmente querem dar a um enfraquecido presidente Xi Jinping uma vitória ilegítima e sangrenta na Ucrânia?
O que os eleitores americanos realmente se importam é com bons empregos e com o custo de vida. Mas a agenda “populista” de Trump - um programa de ilusão sustentado pelo medo de inimigos imaginários - é um fracasso anunciado. Trump está herdando uma economia forte, mas suas políticas mais emblemáticas farão quase nada de positivo pelos trabalhadores menos escolarizados ou melhorarão significativamente a vida da maioria dos americanos. Em vez disso, os ricos ficarão mais ricos, os bilionários ficarão muito mais ricos, e todos os outros provavelmente enfrentarão uma inflação mais alta, cortes nos serviços públicos e os efeitos de uma desregulamentação descontrolada.
*Simon Johnson, Nobel de Economia de 2024 e ex-economista-chefe do FMI, é professor na MIT Sloan School of Management e coautor (com Daron Acemoglu) de “Poder e progresso: Uma luta de mil anos entre a tecnologia e a prosperidade”.
EDITORIAL
INFOCRACIA E BIG TECS: O fim dos tempos - por PAULO TIMM
O que é o tempo? Simploriamente, um lapso entra dois momentos. Poeticamente, como dizia Machado de Assis, ‘um tecido invisível no qual se pode pintar qualquer coisa... Até o nada. E ainda se perguntava: - “O nada sobre o invisível?”. Ainda assim, no decurso dos milênios civilizatórios, o tempo tem sido o espaço da fala, do discurso, através do qual foram se imprimindo denominação às coisas, entretecendo argumentos explicativos sobre suas ocorrências, concertando pactos e impactos, guardando memórias. Discurso, aliás, provém do latim e significa “andar ao redor”, implicando outro. “No discurso somos desviados de nossas próprias convicções em sentido positivo pelo outro. Apenas a voz do outro outorga ao meu comentário, à minha opinião, uma qualidade discursiva”. Pois foi “andando ao redor das coisas e das pessoas” que desenvolvemos, não só a inteligência, mas o processo civilizatório. Humanizamo-nos. Foi o espaço das aquisições milimétricas da racionalidade que nos conduziu ao Sapiens. “Decisões racionais são construídas a longo prazo”. Requerem concentração, foco e meditação que nos remetem, enfim, à faculdade do juízo e ao desenvolvimento frontal do cérebro. “Uma reflexão as precede, que se estende para além do momento, no passado e no futuro”. Nas sociedades sem escrita, enaltecendo o papel dos anciãos como portadores da memória. Com a escrita, o advento dos escribas. Para os filósofos, teólogos e cientistas , então, este processo é um verdadeiro calvário, longo e penoso. Não por acaso, tais criaturas e respectivas instituições foram reverenciadas como detentoras de um saber capaz de orientar as práticas do bem viver. Dos altares xamânicos às Academias. Hoje, isso acabou. Estamos à mercê de influenciadores digitais quase analfabetos, bonitinhos e ordinários. Em poucas décadas, vivenciamos um salto qualitativo na sociedade equivalente à Revolução Agrícola, ao Renascimento e à Revolução Industrial. Mudamos não só a tecnologia da comunicação, mas a cultura, rearticulando técnicas e relações de produção, cosmovisão e visão do mundo, instituições e critérios éticos e de afirmação social. Emergiram os “faladores de merda”.Bullshitters... No mundo da Infocracia o que conta são trocas de informações entre unidades de função que garantem eficiência, dispensando a Política e o Governo, como instâncias éticas, que passam a ser substituídos por Agências de Gestão e Controle. No universo dataísta, a democracia dá lugar a um sistema supostamente isento de valores impulsionado por dados que se ocupam da otimização neutra de resultados. É a vitória definitiva do empirismo experimental que reorientou a Filosofia Moderna desde Hume, para o pragmatismo tão ao gosto dos anglo-saxões. O filósofo coreano Byun Chul assinala, oportunamente, no livro “ Infocracia – Digitalização e a crise da democracia “ -Ed.Vozes:
“A digitalização é, justamente, o que faz erodir o factual. O moderador de televisão Stephen Colbert, (quem colocou em circulação a palavra truthiness (ver-i-dade) comentou certa vez: ‘Eu não acredito em livros. São só fatos. Sem coração’” – pg 87
O tempo extinguiu-se como dimensão da vida cotidiana e excluiu a ordem do discurso que possibilitou a construção da democracia ocidental com base na Razão Comunicativa. Quem primeiro intui isso talvez tenha sido o inventor do para-raios, Benjamin Franklin, que proclamou alto e bom tom: “Tempo é dinheiro”. Como a vida é difícil e todo mundo precisa de grana, o tempo da reflexão foi substituído pela corrida contra o tempo: O self service do dia a dia, onde tudo já vem pronto para o consumo, com um mínimo de dispêndio de energias físicas e psíquicas. A tecnologia da Sociedade Industrial propiciou a mudança e trouxe consigo o fim do tempo como tempo indispensável à humanização da espécie. Somos, hoje, máquinas de clicar moradores das Cidade das Estrelas. Grande livro de ficção, aliás, de Arthur Clarck: “A Cidade e as Estrelas”. Sem tempo para o discurso e para as narrativas, que impunham o reconhecimento da alteridade, nos fragmentamos como pedaços de um panorâmico espelho quebrado: Cada um por si, Deus (Data) por todos. Entramos no Reino da Informação Digital : A Infocracia.
“Chamamos regime de informação, a forma de dominação na qual informações e seu processamento por algoritmos e inteligência artificial determinam decisivamente processos sociais, econômicos e políticos. (...) O regime de informação está acoplado ao capitalismo da informação, que se desenvolve em capitalismo da vigilância ( da era industrial) e que degrada os seres humanos em gado, em animais de consumo de dados” – Byon Chul Han – INFOCRACIA , Digitalização e a Crise da Democracia , pg 7
Vários autores já vinham chamando a atenção para os riscos deste salto no escuro sob os asas do Iluminismo. Karl Marx, crítico implacável deste mundo, há dois séculos já advertia que “tudo que é sólido desmancha no ar”. Em A Era do Vazio, Gilles Lipovetsky, aborda o vazio conectado ao individualismo numa era onde a materialidade e a exposição das redes sociais torna o momento fugaz, os relacionamentos esvaziados e a materialidade exaltada.: “O livro trata do enfraquecimento da sociedade, dos costumes e do indivíduo contemporâneo da era do consumo de massa. Ele explora um modo de sociabilização e individualização inédito, que se instituiu a partir dos séculos XVII e XVIII”. N. Luhman, em Entscheidungen in der ‘Informationsgesellschaft’, assinala, apud Byun cit: “Em uma sociedade da informação, não se pode mais falar de comportamento racional, mas, no melhor dos casos, de comportamento inteligente”.
Neste regime de informação, a vigilância e a disciplina rígida de corpos aprisionados da Era Industrial são substituídas pelo controle invisível das vontades individuais, confundidas com afetada liberdade de escolha.
O novo sujeito, aliás, “subjétil” - expressão de Antonin Artaud para definir o processo que vincula e separa o visível do legível, mais tarde retomada por Jean Baudrillard - porque incapaz de perceber a manipulação de que é objeto através dos perfis acumulados nos bancos de dados, supõe-se livre, autêntico e criativo. “Produz-se e se performa”, na ressonância de suas opiniões através das Redes. Fala para o vazio acreditando protagonizar-se perante o mundo. Acha-se um “player” de uma nova democracia: digital. Tudo sob um clima de suposta e salutar transparência. Não obstante, o novo presídio, cristalino, digital, nada tem de sagrado: é transparente e iluminado, aprazível”, sem mistérios ou instrumentos de tortura, mas sua invisível casa de máquinas urde e tece a dominação contemporânea: é escura e fria. Cruel. Os likes a escondem...Aposentou, por vencimento de validade, o Big Brother orweliano de 1984, substituindo-o pelo “Admirável mundo”novo” de Huxley:
Não por acaso o turismo cresce enormemente com milhões de pessoas viajando permanentemente de um lado pra outro. A curtição do prazer, da beleza, cada vez mais acessível às grandes massas, do divertimento, do sexo fartamente liberado e disponível na Internet, as drogas, dão um novo sentido à vida das pessoas que, não obstante, sucumbem à depressão, à violência e ao suicídio.
Sidarte Ribeiro, em seu livro “O oráculo da noite”- pg 378-, lembra que “medidas da repercussão de rumores no Twitter entre 2006 e 2017 mostram que as postagens mais disseminadas são justamente as mais ficcionais. Robôs em versão algoritmo, ‘almas sem corpo” em plena atividade, já vencem eleições com plataformas extremistas nos Estados Unidos, Inglaterra e no Brasil, através do impulsionamento massivo e automático de memes falsos que contagiam as pessoas até elas acharem que as narrativas mentirosas foram tecidas por elas mesmas. Por excesso de informação e falta de critérios, corremos o risco de perder a confiança no conhecimento acumulado e vivenciar uma nova torres de Babel, um cacarejar de vozes dissonantes sem qualquer possibilidade de harmonização”.
O resultado deste processo de compressão do tempo e saudável submissão do Sapiens ao Big Data, gerou o que alguns analistas estão denominando “rot brain”, eleito, no final do ano 2024 como a expressão do ano, conforme informação do Dicionário Oxford, que destacou ter havido 130 mil buscar pelo verbete no ano que passou. Consta que isso representou um crescimento de 230% entre 2023 e 2024, possivelmente por causa da "preocupação com o impacto trazido por tantos conteúdos de baixa qualidade on-line".
Pode ser traduzida como "cérebro podre" ou "podridão cerebral”, remetendo a um antigo provérbio inglês que diz “if is not rotten do not fix it”...O termo teria sido usado, por primeira vez, nos idos de 1854 por Henry Dvid Thoreau no seu livro “Walden”, um baluarte do ambientalismo. Ele já criticava a tendência à simplificação de ideias complexas, que tanto se disseminariam nas Redes Sociais, ao apodrecimento mal cheiroso das batatas.
Concluindo: Vivemos, com exceção dos “Engenheiros do Caos” que nos administram, numa referência a este título de Giuliano da Empoli, Ed. Topleituras.com, uma era de deterioração mental causada pelo consumo excessivo de conteúdos superficiais e pouco desafiadores à inteligência e ao efetivo exercício do juízo entre distintas possibilidades e cenários , principalmente pela subserviência às redes sociais e dependência cada vez maior dos aparelhos celulares, com reflexos sobre a nossa capacidade para construir uma sociedade verdadeiramente democrática. Perseguimos cada vez mais velocidade em nosso cotidiano, subindo cada vez mais alto no que denominamos “qualidade de vida”, morando e trabalhando em arranha-céus competitivos em altura. Vã ilusão.
EDITORIAL
Estamos em polvorosa, Fernanda Torres ganhou o Globo de Ouro por sua atuação em “Ainda Estou Aqui”!
- (Por Liniane Brum) – Postado por Paulo de Tarso Ricordi no FB
Há uma ferida aberta quando o assunto é ditadura, especialmente quando as lentes – ou as palavras – se voltam para as vítimas do regime. No espaço público a atriz honra essa chaga, com seu discurso sóbrio e figurinos que atentam para o luto, - da personagem representada, da Eunice ela mesma, de famílias-vítimas alquebradas, de um país dividido. No filme, Fernanda Torres atua com a alma, dá corpo à memória de Eunice Paiva e ao desaparecimento de Rubens Paiva.
O filme de Walter Salles contribui, como nenhum outro trabalho fílmico de ficção, para a construção de uma cultura da memória sobre a ditadura militar. Ele partilha com um espectro enorme de pessoas a memória da repressão. É bem sucedido em fazer com que o público empatize com a dor da família Paiva, pois faz isso a partir de um ponto de vista palatável. Uma viúva de um ótimo pai de família, um engenheiro, um homem que sequer “pegou em armas”, mas foi desaparecido pela ditadura. Note-se que o filme apenas menciona a atuação de Rubens Paiva como homem público. Diferentemente do livro de Marcelo Rubens Paiva, não traduz no que ela consistiu, nem vislumbra o quão pacíficas foram as atitudes resistentes do deputado.
Mas as escolhas que tornam o filme, como disse, palatável, não passam apenas pelo ponto de vista narrativo – da família, e, em particular, da matriarca. As escolhas dramatúrgicas são muito responsáveis pela larga adesão do público à história. Não faltam cenas clichês que levam o espectador a estados de "ânimo-padrão". A passagem dos dias de Eunice Paiva na prisão: a contagem dos bastõezinhos, dia a dia, nas paredes da cela, é um exemplo disso. A escolha da linha de atuação da atriz Fernanda Torres, que agora nos põe em polvorosa por ter ganhado o Globo de Ouro, é motor artístico inquestionável.
E há o buraco.
Não um buraco narrativo, mas uma ferida coletiva inseparável do ato de contar essa história. A iniciativa de transformar o trauma em arte, em algo que pudesse transmitir às pessoas não atingidas diretamente pela repressão, a memória da ditadura, durante muitos anos foi serviço dos familiares de vítimas da repressão. Por vítimas eram tomados os torturados, mortos, exilados, desaparecidos, perseguidos. O tempo passou, e hoje se sabe que também são vítimas aqueles que, como Eunice Paiva, passaram toda uma existência convivendo com a dor, os percalços civis e econômicos e o indizível vácuo do desaparecimento, entre outras perpetrações.
O buraco pode ser fechado com esse trabalho? Não sei. Talvez ninguém saiba. (Alguém sabe?) Sobretudo o reconhecimento público, a tentativa de reconciliação no plano coletivo, - eu disse tentativa - por outro lado, dá um passo sem igual a partir do impacto de “Ainda Estou Aqui”. A partir da visibilidade que Fernanda Torres e sua premiação dá, ainda mais, ao filme.
“Ainda Estou Aqui” está a fazer o que governo brasileiro se negou em 2024: celebrar a efeméride dos 60 anos do Golpe de 1964, mobilizar o factual, mas também o simbólico, abrindo espaço para a luz entrar. Propiciar atmosfera para a ferida cicatrizar. Esse bonde que o nosso governo perdeu, a cultura alcançou, - ou alçou. Lamber nós mesmos, por nós – brasileiros - nossas feridas: eis nossa política, mas também nossa arte.
Estamos em polvorosa, Fernanda Torres ganhou o Globo de Ouro por sua atuação em “Ainda Estou Aqui”!
Por Liniane Brum, escritora, sobrinha do desaparecido político Cilon Cunha Brum, morto na Guerrilha do Araguaia.
EDITORIAL
Do globalismo ao neofascismo - História de uma transição. Como as políticas neoliberais devastaram o Estado nacional, desampararam as maiorias e levaram parte delas a reivindicar os “líderes fortes” que a direita cultua. Como uma alternativa pode desmontar a farsa
por Wolfgang Streeck - Publicado 28/11/2024 às 19:35 –
Atualizado 23/12/2024 às 18:20
Parte inferior do formulário. Tradução de Glauco Faria- Do globalismo ao neofascismo - Outras Palavras
Com o advento da globalização neoliberal, a democracia como meio de intervenção política igualitária na economia caiu em descrédito. As elites de ambos os lados do Atlântico lideraram esse processo. Elas viam a democracia como tecnocraticamente “pouco complexa” diante da “complexidade exacerbada” do mundo; propensa a sobrecarregar o Estado e a economia; e politicamente corrupta devido à sua falta de vontade de ensinar aos cidadãos “as leis da economia”.
De acordo com essa linha de raciocínio, o crescimento não vem da redistribuição de cima para baixo, mas de baixo para cima: na extremidade inferior da distribuição de renda, por meio da abolição do salário mínimo e da redução dos benefícios da seguridade social; e na extremidade superior, ao contrário, por meio de melhores oportunidades de lucro e salário, apoiadas por impostos mais baixos. O processo subjacente foi uma transição para um novo modelo de crescimento hayekiano, destinado a substituir seu antecessor keynesiano como parte da revolução neoliberal.
Como em qualquer doutrina econômica, essas ideias devem ser entendidas como representações camufladas de restrições e oportunidades políticas decorrentes de uma distribuição de poder historicamente contingente, disfarçadas como manifestações de leis “naturais”. A diferença é que, no mundo hayekiano, a democracia não aparece mais como uma força produtiva, mas como uma pedra de moinho em volta do pescoço do progresso econômico. Por esse motivo, a atividade distributiva espontânea do mercado deve ser protegida da interferência democrática por muros chineses de todos os tipos ou, melhor ainda, pela substituição da democracia pela “governança global”.
A desintegração do modelo padrão de capitalismo democrático em meio ao avanço da globalização foi muito analisada. No decorrer de cerca de duas décadas, desde o desaparecimento do comunismo soviético, o neoliberalismo teve um retorno surpreendente: Hayek, que por muito tempo foi ridicularizado como líder de um culto sectário, eclipsou figuras importantes dos assuntos mundiais como Keynes e Lênin. As ideias de Hayek penetraram profundamente no pensamento não apenas de economistas e instituições internacionais, mas também de governos nacionais e partidos políticos. Isso incluiu seus apelos por um sistema no qual a propriedade privada seria protegida internacionalmente e a liberdade do mercado global prevaleceria sobre a política nacional; pela liberalização por meio de sistemas jurídicos idênticos em Estados formalmente soberanos (“isonomia”); pela liberalização econômica em federações internacionais heterogêneas; pela proibição do intervencionismo estatal por meio da lei de concorrência internacional; e, não menos importante, pela livre circulação de mercadorias, serviços, capital e pessoas como meio de neutralizar economicamente o Estado-nação. Os governos nacionais e os partidos políticos começaram a compartilhar as suspeitas da teoria da escolha pública em relação a eles mesmos.
Até ser desmistificado pela Grande Recessão, o neoliberalismo se tornou a doutrina político-econômica dominante do capitalismo moderno: a utopia de uma economia de mercado capitalista global autorregulável, na qual as políticas nacionais se limitavam ao estabelecimento e ao apoio dessa economia, à promoção de uma adaptação flexível a ela e, talvez, à preservação folclórica das tradições culturais e políticas locais para que as pessoas se sentissem em casa em uma sociedade cada vez mais sem teto.
O avanço do modelo de crescimento globalizante-neoliberal foi acompanhado por uma erosão gradual do modelo padrão de democracia do pós-guerra. Desde o final da década de 1970, houve um declínio notável na participação em eleições de todos os tipos em todas as democracias capitalistas. Isso tem sido especialmente verdadeiro entre aqueles que estão na base da distribuição de renda e de oportunidades de vida, que são os que mais precisam de proteção social e redistribuição. Ao mesmo tempo, os partidos políticos, independentemente das diferenças institucionais nacionais, sofreram um declínio drástico no número de membros. O mesmo ocorreu com os sindicatos, que, desde o final da década de 1980, raramente conseguiram exercer seu direito de greve com alguma perspectiva de sucesso. Quanto ao sistema partidário, conforme demonstrado por Peter Mair, os partidos estabelecidos do centro se distanciaram cada vez mais da sociedade e de seus eleitores, indo para o aparato do Estado, e sua crescente estatização teve sua contrapartida na privatização da sociedade civil.
A principal força motriz desse processo foi a compulsão por governar “com responsabilidade”, como diz Mair, derivada da própria globalização – em outras palavras, da real ou suposta falta de alternativas políticas ao pensamento neoliberal único do Consenso de Washington que se espalha. Assim como os sindicatos que querem preservar os empregos de seus membros só podem fazer exigências salariais moderadas, os partidos políticos que querem governar seus Estados, agora inseridos no mercado global, não podem se deixar influenciar demais por seus membros. Para usar os termos de Mair: a responsabilidade veio com o preço da capacidade de resposta.
O colapso final do modelo padrão coincidiu com a globalização acelerada da década de 1990. Quatro aspectos desse processo são característicos da involução liberal da democracia capitalista. O que está envolvido aqui é uma mudança específica nos interesses e atitudes representados pelo centro do sistema político democrático, a formação de um padrão correspondente de oferta e demanda política e o aumento dos conflitos sobre o status do Estado-nação em face dos interesses crescentes na restauração de uma política de proteção e redistribuição.
Em primeiro lugar, nos sistemas políticos padrão do pós-guerra, os partidos conservadores de centro-direita – que na Europa Continental geralmente tinham uma orientação democrata-cristã – haviam assumido a tarefa de conciliar o tradicionalismo social com a modernização capitalista. Isso se tornou cada vez mais difícil sob a pressão da globalização. O fim do socialismo de fato existente não significava apenas o desaparecimento da antítese do conservadorismo burguês, cuja existência havia facilitado a reconciliação do tradicionalismo com o capitalismo. Havia também novas pressões competitivas sobre os partidos de centro-direita para que abandonassem seu equilíbrio entre progresso e preservação e ficassem do lado dos destruidores criativos e dos modernizadores culturais em nome da competitividade econômica nacional. (Um exemplo entre muitos outros é a transição politicamente promovida para uma estrutura social de participação universal no mercado de trabalho, que enfraqueceu muito a receptividade da sociedade às políticas familiares conservadoras). Segmentos cada vez maiores do eleitorado culturalmente conservador ficaram politicamente desamparados.
Em segundo lugar, ocorreu um desenvolvimento correspondente dentro dos partidos, principalmente social-democratas, na outra metade esquerda do centro político. A abertura acelerada das economias nacionais os privou do instrumento mais importante de sua caixa de ferramentas políticas: a política econômica keynesiana em sua versão pós-guerra. O mesmo pode ser dito sobre o rápido aumento da dívida pública após a década de 1970 e o fato de que, em mercados internacionais abertos, os custos de uma política social nacional e descomodificadora ameaçavam se tornar uma desvantagem competitiva. Se os partidos conservadores do centro se tornaram os gerentes do progresso capitalista, seus colegas social-democratas se tornaram seus facilitadores, garantidores e propagandistas, falando com entusiasmo a seus eleitores sobre a luz da prosperidade renovada no fim do túnel da globalização.
Na Alemanha, por exemplo, os eleitores sociais-democratas tradicionais foram informados de que era melhor se reinventarem como empreendedores individuais – como a Egos Inc. – com o apoio do Estado, se necessário. Também lhes foi dito que a época moderna exigia uma política social voltada para o investimento, em vez de uma política voltada para o consumo; que a adaptação flexível era preferível à aposentadoria precoce; e que a solidariedade internacional agora significava submeter-se à concorrência nos mercados internacionais. Isso também não foi bem aceito. Enquanto os vitoriosos entre seus apoiadores se sentiam parcialmente representados – mas apenas parcialmente, já que boa parte deles se mudou para os novos partidos verdes de centro-esquerda – os perdedores da globalização, achando que tudo isso era demais para suportar, abandonaram a bandeira da modernização social-democrata, primeiro não comparecendo às urnas, depois se voltando para uma nova direita, longe do caminho democrático-capitalista.
Em terceiro lugar, ao se unirem à frente unida da globalização, tanto a centro-direita quanto a centro-esquerda perderam suas identidades políticas, por mais vagamente definidas que tenham sido no início. No processo de adaptação ao mercado mundial, a política democrática do pós-guerra deixou de ser a busca de longo prazo de diferentes modelos de uma sociedade ideal – um modelo paternalista-hierárquico, por um lado, e um modelo igualitário e sem classes, por outro – e passou a ser uma série de reações pragmáticas e de curto prazo às condições do mercado mundial em constante e imprevisível mudança. Os políticos e a política se tornaram menos ideológicos do que nunca, sem perspectiva e, portanto, indistinguíveis uns dos outros. Dessa forma, a democracia poderia se transformar em pós-democracia, entretendo os eleitores como espectadores passivos, ao mesmo tempo em que trazia spin doctors e técnicos de relações públicas para elaborar políticas.
O comportamento do voto – tanto as intenções contadas pelos estrategistas eleitorais quanto as escolhas dos próprios eleitores – mudou de acordo com isso: não mais orientado para um ideal social coletivo, um futuro comum pelo qual lutar como cidadãos, mas dissociado de posições de classe e ideologias, reagindo ao momento, em vez de a um futuro ideal. Como resultado, a rotatividade de eleitores entre os partidos aumentou, enquanto os antigos partidos do modelo padrão podiam contar cada vez menos com o apoio estável de uma base estabelecida.
Em quarto lugar, a despolitização pragmática da política provocada pela globalização, especialmente na esfera da economia política, juntamente com o surgimento de uma política econômica uniforme e de acordo com o mercado, acabou com a estruturação do conflito político-partidário ao longo do eixo capital-trabalho, como havia moldado a diferenciação e a integração política no modelo padrão. Ele foi substituído por uma nova clivagem que atravessou a estrutura de patrocínio do antigo sistema, entre uma maioria cada vez menor que se sentia amplamente representada na política pós-democrática e uma minoria cada vez maior que se sentia excluída. Isso se refletiu, entre outras coisas, em um declínio na participação dos eleitores e em um alto grau de volatilidade eleitoral, bem como em um declínio dramático na confiança e nas expectativas dos cidadãos em relação à política e aos partidos em todos os grupos.
Nos anos de internacionalismo e suas crises, outra clivagem se cristalizou entre uma orientação nacional e uma orientação internacional dos interesses políticos. Aqueles que sentiam que haviam se beneficiado da globalização de uma forma ou de outra se encontravam na estreita faixa da política da Terceira Via. Por outro lado, entre os perdedores econômicos e culturais da globalização, aqueles que não se viam representados pelo centro político reorganizado, desenvolveu-se uma preferência há muito não articulada e politicamente submersa por uma restauração da autonomia política e da capacidade do Estado-nação. Essa preferência podia ser cada vez mais mobilizada por partidos e movimentos orientados para um nacionalismo de direita ou de esquerda – e, por esse motivo, excluídos como “populistas” do espectro dominante.
A crise de 2008 marcou o fim do auge do neoliberalismo. Muito havia sido prometido e muito pouco foi cumprido. As dúvidas sobre a democracia, se não sobre o capitalismo, começaram a crescer entre as pessoas comuns, que se redescobriram e se reconstituíram politicamente de várias formas e cores, tanto como manifestantes quanto como eleitores. A perda da estabilidade e da confiança, a distribuição cada vez mais desigual da riqueza, que cresce cada vez menos, e a estagnação econômica, apesar das demandas por mudanças estruturais, juntamente com a crescente insegurança cultural e o desprezo da elite pelos que foram deixados para trás, deram origem a contra-movimentos populares plebeus vindos de baixo. O regime neoliberal pós-democrático reagiu a esses movimentos com horror.
Independentemente de terem surgido da experiência da vida cotidiana globalizada ou de terem sido oportunisticamente fomentados por novos atores políticos, o que eles tinham em comum era e é uma profunda desconfiança de qualquer tipo de “abertura” com eventos incertos, do livre comércio à migração, acompanhados por uma redescoberta da solidariedade local e da justiça local, em nível regional, nacional e de classe, em todas as combinações imagináveis. Já nos anos anteriores à crise, a globalização havia sido objeto de protestos; depois, por meio de uma infinidade de desvios, ela provocou uma repolitização de uma vida política que estava paralisada há algum tempo, culminando em uma disputa fundamental, mais ou menos articulada, sobre o lugar correto e legítimo da política, da democracia e da solidariedade na sociedade.
Hoje, em todos os países do capitalismo da OCDE, alguns dos remanescentes do modelo padrão de democracia do pós-guerra estão sendo redescobertos e utilizados como recursos institucionais para a resistência popular contra a modernização capitalista e cultural acelerada e a mudança estrutural politicamente desempoderadora impulsionada pela globalização. O que isso significa é uma luta amarga sobre o futuro caráter do Estado, tanto nacional quanto internacional: centralizado e integrado para proteger a globalização, ou descentralizado e subdividido para impedir seu avanço; elitista ou igualitário; (pequeno) burguês ou plebeu; tecnocrático ou democrático? Nos anos anteriores à Covid, começaram a surgir os contornos de uma reversão da tendência de queda na participação política, com um aumento nos protestos e greves mais frequentes. Os partidos de modelo padrão abandonados e seus aliados na mídia tiveram pouco a ver com isso. Na verdade, eles combateram a nova onda de politização com todo o arsenal de armas de que dispunham – propagandísticas, culturais, legais, institucionais – muitas vezes, sem querer, soprando vento nas velas daqueles que eles haviam enquadrado como inimigos não apenas da democracia, mas também do Estado.
Três décadas de centralização e unificação político-econômica neoliberal mudaram as democracias ocidentais em seu cerne: partidos políticos centristas declinaram conforme a participação eleitoral se recuperou, sindicatos perderam membros e status político, e novos partidos de direita, ou correntes populistas dentro dos partidos existentes, corroeram o conservadorismo centrista, incluindo a social-democracia tradicional. Em 2023, a nova oposição havia se transformado em uma força política mais ou menos influente a ser considerada em todos os países ocidentais, em alguns se tornando um parceiro informal ou formal no governo, às vezes até mesmo como sua força política dominante.
Isso vale para os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, bem como para a Itália, França, Áustria e toda a Escandinávia, sem falar na Polônia, Hungria e Europa Central e Oriental de forma mais ampla. O que quer que possa dividir os novos nacionalistas de direita, o que eles têm em comum é a oposição à internacionalização e à centralização e integração da governança que vêm com ela, trazendo à tona e politizando uma linha de conflito nas democracias capitalistas inerente à Nova Ordem Mundial pós-1990 do neoliberalismo global.
Hoje, as pressões por autogoverno local — por descentralização da governança por meio da restauração da soberania nacional — e a questão de como responder a elas são uma questão central de políticos e da política em contextos políticos e econômicos nacionais e internacionais. Forças políticas que insistem na soberania de seus Estados-nação — em relação a outros Estados imperiais, bem como a organizações internacionais dominadas por estes últimos, ou a mercados livres globais ou continentais — podem alegar que estão defendendo uma condição indispensável da democracia nacional, mesmo que a queiram apenas para si, e não também para seus oponentes. Aqueles que tentam preservar a democracia liberal do período neoliberal tendem a subestimar o poder da oposição a ela, enquanto superestimam a capacidade de governar, política e tecnicamente, de organizações supranacionais e países hegemônicos imperiais. A democracia neoliberal foi incapaz de evitar uma profunda perda de confiança em suas instituições por parte dos cidadãos, o que é outro resultado dramático de longo prazo das três décadas neoliberais desde o início dos anos 1990. Nem o centralismo neoliberal foi capaz de sustentar instituições nacionais ou internacionais capazes de estabilizar uma economia de mercado global; como os mercados falharam, a política neoliberal, que havia apostado em sua infalibilidade, estava fadada a falhar também.
A revolução neoliberal havia destruído completamente a ordem política e social do compromisso do pós-guerra, descartando um simples retorno a ele. Isso torna ainda mais necessário entender as causas precisas do fracasso do centralismo supranacional para entender os possíveis contornos da democracia pós-globalista e pós-neoliberal. Somente dessa forma podemos esperar preencher o vazio político deixado pelo neoliberalismo com um equivalente funcional do modelo padrão do pós-guerra. Como seu predecessor, um modelo pós-globalização de democracia — descentralizada — teria que ser incorporado em uma ordem internacional acomodatícia que respeitasse a autonomia política local e a soberania do Estado nacional como condições fundamentais para a democracia na sociedade e na economia.
A este respeito, o destino da União Europeia oferece lições sobre a fragilidade do internacionalismo estatista, os limites da governança supranacionalmente centralizada, da integração como unificação — em suma, sobre a futilidade de tentativas mais ou menos bem-intencionadas de consignar o Estado-nação como o local da soberania distribuída para a lata de lixo da história. Olhando em particular para o estado da União Europeia no final do neoliberalismo e no início da pós-globalização, pode-se aprender sobre as forças de resistência a uma ampliação supranacional hierárquica-tecnológica da política, como aquelas que afastaram os Estados-membros da UE que deveriam crescer para se tornarem os Estados Unidos da Europa.
Além disso, a maneira como as rédeas foram apertadas novamente e a centralização restaurada no curso da guerra na Ucrânia sugere que a unificação supranacional de Estados-nação soberanos é melhor perseguida com a ajuda de um inimigo ou aliado comum — um Estado imperial agindo como um unificador externo ao definir ou mesmo criar um problema de segurança internacional comum a ser tratado supranacionalmente sob liderança imperial: uma questão de vida ou morte, bem diferente de uma rendição voluntária da soberania nacional em prol da prosperidade econômica e do conforto cosmopolita, e extremamente perigosa para começar.
Nota: Este ensaio foi adaptado do último livro do autor, Taking Back Control?: States and State Systems After Globalism, publicado pela Verso.
Wolfgang Streeck é diretor do Instituto Max Planck para Pesquisa Social em Colônia e professor de sociologia na Universidade de Colônia. Entre seus livros estão “Buying Time: The Delayed Crisis of Democratic Capitalism”.
EDITORIAL
O fim dos tempos, por PAULO TIMM
Como as pessoas usaram seu tempo desde 1940 –
https://www.facebook.com/reel/1103094131418205/?s=single_unit&_cft[0]=AZXNbI-EQgi5B2jGTUvCHxBST4Jnpdmb9EXLuIwffkvaWOPwqE3Iy--tucMsqG739IVuy6pUaxgurzFc4KTlHyEZmDx7jCpIDaBi8eejHXogIplZ9u-UBtIMOBPO_V5Rz6zsESezhIaJZewbYd9qlcH7NH0Bl7Gmgqw9v-Zv2VjsfgGh7wo89NaAfP_7QoRptQo&tn_=H-R
O ASSUNTO g1 - Brain rot - a exaustão que marcou 2024 - 'Brain rot', que pode ser traduzido como 'podridão cerebral', foi eleito o termo do ano pelo Dicionário Oxford por causa do uso excessivo de redes sociais para consumo de conteúdos considerados pouco desafiadores e triviais - O Assunto #1375: Brain rot - a exaustão que marcou 2024 | O Assunto | G1
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O que é o tempo? Simploriamente, uma lapso entra dois momentos. Poeticamente, como dizia Machado de Assis, ‘um tecido invisível no qual se pode pintar qualquer coisa...Até o nada. E ainda se perguntava: - “O nada sobre o invisível?”. Ainda assim, no decurso dos milênios civilizatórios, o tempo tem sido o espaço da fala, do discurso, através do qual foram se imprimindo denominação às coisas, entretecendo argumentos explicativos sobre suas ocorrências, concertando pactos e impactos, guardando memórias. Discurso, aliás, provém do latim e significa “andar ao redor”, implicando outro. “No discurso somos desviados de nossas próprias convicções em sentido positivo pelo outro. Apenas a voz do outro outorga ao meu comentário, à minha opinião, uma qualidade discursiva”. Pois foi “andando ao redor das coisas e das pessoas” que desenvolvemos, não só a inteligência, mas o processo civilizatório. Humanizamo-nos. Foi o espaço das aquisições milimétricas da racionalidade que nos conduziu ao Sapiens. “Decisões racionais são construídas a longo prazo”. Requerem concentração, foco e meditação que nos remetem, enfim, ao juízo e ao desenvolvimento frontal do cérebro. “Uma reflexão as precede que se estende para além do momento no passado e no futuro”. Para os filósofos, teólogos e cientistas, então, este processo é um verdadeiro calvário, longo e penoso. Não por acaso, tais criaturas e respectivas instituições eram reverenciadas como detentoras de um saber capaz de orientar as práticas do bem viver. Hoje, isso acabou. O tempo extinguiu-se como dimensão da vida cotidiana e excluiu a ordem do discurso que possibilitou a construção da democracia ocidental com base na Razão Comunicativa. Quem primeiro intui isso talvez tenha sido o inventor do para-raios, Benjamin Franklin, que proclamou alto e bom tom: “Tempo é dinheiro”. Como a vida é difícil e todo mundo precisa de grana, o tempo da reflexão foi substituído pela corrida contra o tempo: O self service do dia a dia, onde tudo já vem pronto para o consumo. A tecnologia propiciou a mudança e trouxe consigo o fim do tempo como tempo indispensável à humanização da vida. Somos máquinas de clicar inseridos na Cidade das Estrelas. Sem tempo para o discurso e para as narrativas, que impunham o reconhecimento da alteridade, nos fragmentamos como pedações de um espelho quebrado: Cada um por si, Deus (Data) para todos. Entramos no Reino da Informação: Infocracia.
“Chamamos regime de informação, a forma de dominação na qual informações e seu processamento por algoritmos e inteligência artificial determinam decisivamente processos sociais, econômicos e políticos. (...) O regime de informação está acoplado ao capitalismo da informação, que se desenvolve em capitalismo da vigilância ( da era industrial) e que degrada os seres humanos em gado, em animais de consumo de dados” – Byon Chul Han – INFOCRACIA , Digitalização e a Crise da Democracia , pg 7
Neste regime de informação, a vigilância e a disciplina rígida de corpos aprisionados são substituídas pelo controle invisível das vontades individuais, confundidas com liberdade de escolha. O novo sujeito, aliás, subjétil, porque incapaz de perceber a manipulação de que é objeto através dos perfis acumulados nos bancos de dados, supõe-se livre, autêntico e criativo. “Produz-se e se performa”, na ressonância de suas opiniões através das Redes. Acha-se um protagonista da democracia digital. Tudo sob um clima de transparência salutar. O novo, presídio, digital, nada tem de sagrado: é transparente e iluminado, aprazível”, sem mistérios ou instrumentos de tortura. Mas sua invisível casa de máquinas urde e tece a dominação, é escura e fria. Cruel. Os likes a escondem...
“Na sociedade da informação, os locais de incorporação do regime disciplinar se desfazem em redes abertas. Para o regime da informação, valem os seguintes princípios topológicos: descontinuidades são produzidas em prol de continuidades. No lugar de encerramentos e conclusões, aparecem aberturas. Celas isoladas são substituídas por redes de comunicação. A visibilidade é , então, produzida de toda outra maneira, não pelo isolamento, mas pela conexão. (...) Quanto mais geramos dados, quanto mais intensivamente nos comunicamos, mais a vigilância (controle) fica eficiente sob o véu da conveniência do menor esforço. O telefone móvel como aparato de vigilância e submissão explora a liberdade e a comunicação. (...) Paradoxalmente, é o sentimento de liberdade que assegura a dominação.” (Cit. pg13)
Editorial Cultural FM Torres RS - www.culturalfm875.com
'O milagre alemão terminou, e Europa sofrerá as consequências'
Play audio, "'O milagre alemão terminou, e Europa sofrerá as consequências'", Duration
15,35- 23 nov 24 https://www.bbc.com/portuguese/articles/c3wq292z3w5o
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Legenda do áudio,O governo de coalizão da Alemanha se desintegrou em novembro —
e agora há eleições gerais marcadas para 23 de fevereiro de 2025Article
informationRole,BBC News Mundo
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A Alemanha está passando por um momento um tanto turbulento. Seus
indicadores econômicos estão deixando a desejar há anos e ameaçam seu
status de "milagre econômico". E, com a fragilidade da principal economia da
zona do euro, os países vizinhos também vão sofrer.
O país não é mais o Exportweltmeister, o "campeão mundial de exportações",
como era conhecido nos mercados internacionais.
No auge da hiperglobalização, a Alemanha chegou a ser o maior exportador do
mundo. O gás russo fornecia combustível barato às suas indústrias, e
a China era um grande parceiro comercial.
Mas esse mundo com a Alemanha no topo já não existe mais. Acontecimentos
como o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), as tarifas de Donald
Trump, a invasão da Ucrânia pela Rússia e a ascensão da China, que passou
de compradora a concorrente, afetaram seu modelo industrial.
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Não foram as únicas causas.
Sabotagem? O que se sabe sobre rompimento de cabos submarinos na
Alemanha
Fim do Matérias recomendadas
"Talvez o maior choque de todos tenha vindo da tecnologia", diz Wolfgang
Münchau, diretor da publicação especializada EuroIntelligence e autor do
livro Kaput: The End of the German Miracle ("Kaput: o Fim do Milagre
Econômico Alemão", em tradução livre).
"A Alemanha de hoje tem uma das piores redes de telefonia celular da Europa.
O fax ainda reina no Exército e nos consultórios médicos. E há muitas lojas que
ainda só aceitam dinheiro em espécie."
"Para dar um exemplo de como o país ficou para trás, no início os dirigentes da
indústria automotiva alemã, em sua maioria homens, consideravam os carros
elétricos brinquedos para meninas", escreveu o autor.
Para Münchau, esse declínio vem se desenvolvendo há anos. "As piores
decisões foram tomadas durante o longo reinado de Angela Merkel. Na década
de 2010, a Alemanha aumentou sua dependência do gás russo, investiu menos
em fibra óptica e infraestrutura digital, e aumentou sua dependência das
exportações."
"É um modelo que, por diversos fatores, se tornou obsoleto."
CRÉDITO,GETTY IMAGES
Legenda da foto,Em outubro, a Volkswagen registrou uma queda de 64% nos lucros do
terceiro trimestre. A Mercedes-Benz e a BMW também registraram perdas
Apesar de a Alemanha ser celebrada como uma líder do mundo ocidental,
houve, segundo Münchau, uma carência de reformas econômicas significativas
e um foco excessivo na política externa em detrimento da inovação e do
planejamento econômico de longo prazo.
Hoje, as grandes empresas do setor químico, de engenharia e automotivo
estão sofrendo — e, com elas, as redes empresariais menores que fornecem
componentes.
O exemplo mais evidente foi apresentado recentemente pela Volkswagen. O
maior empregador do setor privado da Alemanha ameaça fechar fábricas no
país pela primeira vez em 87 anos de história.
Made in Germany já foi um símbolo de uma tecnologia avançada e confiável,
mas a Alemanha não soube adaptar sua indústria mecânica ao modelo digital,
segundo Münchau.
Além disso, em novembro, o governo de coalizão liderado por Olaf Scholz
entrou em colapso, forçando a convocação de novas eleições para fevereiro de
2025.
Mas como é possível que uma das nações tecnologicamente mais avançadas
do mundo tenha ficado para trás?
Nesta entrevista, Wolfgang Münchau analisa os diversos fatores que
arrastaram a principal economia da zona euro para este momento conturbado.
BBC News Mundo - A Alemanha tem hoje uma economia com
crescimento muito baixo, ao qual ninguém está acostumado. O que vai
acontecer na Europa?
Wolfgang Münchau - A Europa vai sofrer. A Alemanha foi seu motor de
crescimento, mas agora uma Alemanha que não cresce está politicamente
menos disposta a ter grandes programas de apoio à União Europeia (UE). O
país é um grande contribuinte líquido para seu orçamento.
Mas não se pode contar com a Alemanha estagnada para financiar a UE da
mesma forma que antes, e ela pode relutar em financiar a guerra na Ucrânia.
Porque se não há crescimento, não há margem fiscal para expandir o
orçamento. Por isso, veremos decisões difíceis, e todas elas estão interligadas.
BBC News Mundo - Há algum país que possa substituir a Alemanha como
motor da Europa?
Münchau - Não acredito que haja algum, sobretudo por uma questão de
tamanho, a Alemanha tem 85 milhões dos 500 milhões de habitantes da União
Europeia, e sua economia é cerca de 20% maior que a segunda maior
economia da UE.
CRÉDITO,GETTY IMAGES
Legenda da foto,Depois de quatro mandatos como chanceler, Angela Merkel deixou o
poder em dezembro de 2021
BBC News Mundo - Quando começou o milagre econômico alemão?
Münchau - Começou realmente depois da Segunda Guerra Mundial. No fim da
década de 1940, houve um período de novas empresas e muito dinamismo na
economia, com base na engenharia e na indústria.
Os oleodutos e os reatores nucleares foram as engrenagens que
impulsionaram a economia alemã. Eram a força vital do seu modelo industrial.
Foram estes oleodutos que mais tarde dariam à Alemanha acesso ao petróleo
norueguês e ao gás russo. Essa primeira fase do milagre durou até o início da
década de 1970.
O período de 1980 a 1990 foi mais problemático porque a unificação custou
muito dinheiro. Mas, em 2005, chegaria uma segunda fase, que durou até
aproximadamente 2018.
A Alemanha viveu um período bem-sucedido entre 2005 e 2015, conhecido
como "milagre alemão moderno".
Legenda da foto,Com seus 80 milhões de habitantes e poder exportador, a Alemanha é a
economia mais forte do continente europeu
Entre os fatores que contribuíram para este sucesso, estão as reformas do
mercado de trabalho introduzidas pelo chanceler Gerhard Schröder em 2003,
que levaram à moderação salarial, além do gás barato da Rússia, da
liberalização do transporte marítimo e da logística de contêineres.
E também havia a forte demanda de bens industriais alemães por parte de
economias em rápido crescimento, como a China ou a Índia.
BBC News Mundo - O que indica que "o milagre" acabou?
Münchau - Em termos de dados e estatísticas publicadas, podemos ver isso
por volta de 2018. Mas tem sido um processo progressivo, cujas causas
remontam a muitos anos atrás.
O que aconteceu com a Alemanha é que ela se tornou muito dependente de
algumas indústrias, em especial da indústria automotiva. Isso é bastante raro.
A maioria dos países grandes, como Estados Unidos, China, Brasil ou Japão,
possui indústrias diversificadas. Eles não dependem de um ou dois setores.
CRÉDITO,GETTY IMAGES
Legenda da foto,O fechamento das centrais nucleares e o fim da energia barata se
deveram a razões políticas, e não econômicas
Mas a Alemanha se tornou muito dependente dos automóveis, dos produtos
químicos e também das máquinas de engenharia mecânica.
Essas três indústrias eram extremamente importantes para a economia alemã
e sofreram problemas semelhantes desde 2018.
BBC News Mundo - Quais foram esses problemas?
Münchau - Um deles foi a crise do aumento dos preços da energia, que se
tornou um problema específico após a invasão da Ucrânia por Vladimir Putin.
Mas, no caso do setor automotivo, aconteceu outra coisa: não conseguiu
inovar.
Não está na vanguarda dos veículos elétricos. Continuou vendendo seus
automóveis antigos movidos a combustível, e investiu nas tecnologias erradas.
O que vemos agora é que a Tesla e os chineses são os líderes em veículos
elétricos, e os alemães ficaram para trás.
De certa forma, a obsessão da Alemanha com a indústria destaca a
incapacidade do país de aceitar que as economias ocidentais modernas são
baseadas em serviços, e não em manufatura.
CRÉDITO,SWIFT PRESS
Legenda da foto,Wolfgang Münchau, diretor da EuroIntelligence, explica por que a
Alemanha ficou para trás
BBC News Mundo - Um amigo seu disse para você não escrever este
livro, porque a Alemanha tem um histórico de se recuperar quando menos
se espera. Isso pode acontecer desta vez? Ela pode renascer?
Münchau - Esta crise é diferente das anteriores, quando os problemas eram a
competitividade e os custos. Esta é a crise em que a Alemanha, como país,
está vendendo produtos obsoletos, que já não estão na vanguarda da
tecnologia.
Isso se deve ao fato de a Alemanha ter perdido o século 21 em termos de toda
a revolução digital. Passou anos investindo nas tecnologias equivocadas. Nos
automóveis, isso é óbvio porque podemos ver.
Mas também vimos uma digitalização lenta das indústrias existentes. A
tecnologia digital invadiu os dispositivos mecânicos em que o país era líder e
não soube se adaptar.
BBC News Mundo - Este fenômeno na indústria está relacionado com a
aversão dos alemães à digitalização que você menciona em Kaput?
Münchau - Acho que sim. É possível ver isso em muitas áreas da vida pública
e em muitos setores do governo que ainda usam aparelhos de fax. Da mesma
forma que nos consultórios médicos.
Isso também pode ser observado na telefonia e na cobertura de celular, que é
muito fraca em muitos lugares, e na implantação de fibra óptica, que também
está muito atrasada.
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Editorial
Y asi pasan los dias.. Quizás, quizás, quizáz! Por Paulo Timm/20/XII
A política econômica atual, com juros altos e arrocho fiscal, perpetua a chantagem do financismo, que usa o discurso da “dominância fiscal” para justificar seus ganhos, ignorando a real causa da inflação e impondo sacrifícios aos mais pobres - Paulo Kliass in Dominância fiscal, o apocalipse da vez - 17/12/2024
De cada 10 notícias sobre economia 8 são publicadas por veículos que pertencem a investidores. Hoje o poder de especular está associado ao poder de criar a narrativa (determinar o que é “verdade”). O país sob a mira dos sequestradores…- Eduardo Moreira - https://youtu.be/ufXzhU9t3zE?si=2A4cQIeaBdzBZpgV
A economia desgovernada - Por Ladislau Dowbor
https://www.lemonde.fr/idees/article/2024/06/13/aujourd-hui-les-milliardaires-ne-paient-quasiment-pas-d-impots-car-une-grande-partie-de-leurs-revenus-proviennent-du-capital_6239271_3232.html
2024 – Dolar em alta- Erros e Crise na Economia - Aceertos de Lula – Carlos Paiva e Gabriel Wainer - https://www.google.com/search?q=dolar+em+alta+e+crise+na+economia+-+CARLOS+PAIVA+YTUBE&oq=dolar+em+alta+e+crise+na+economia+-+CARLOS+PAIVA+YTUBE&gs_lcrp=EgZjaHJvbWUyBggAEEUYOTIJCAEQIRgKGKAB0gEJMjUzODNqMGo3qAIIsAIB&sourceid=chrome&ie=UTF-8#fpstate=ive&vld=cid:0d31e3bd,vid:0GzGdyZs3RE,st:0
Semana passada, o assunto central da Mídia foi a saúde do Lula. Não faltaram aí, inclusive, manifestações indecorosas de alguns, regozijando=se com sua morte eventual. Lamentável. Nesta semana a questão do dólar está ocupando as manchetes. Saltou de R$ 5,7 para um nível de R$ 6,30 no dia 19. Tocou horror. Os alarmistas de sempre saem a campo dizendo que a inflação vai explodir, enquanto os governistas denunciam um ataque especulativo. Em meio às controvérsias Haddad, Ministro da Fazenda, reitera que não há perigo nenhum: os indicadores da economia demonstram que estamos indo bem. Um atento e experiente analista econômico, Eduardo Moreira, porém se detém na análise dos fatos e sugere a metáfora do sequestro para explicar os riscos da conjuntura. Diz ele: o sequestrador não pratica o seu crime para matar a vítima, mas para ganhar uma grana, sabendo, entretanto, que pode dar tudo errado e vir a ser morto pela Polícia. A situação que estamos vivendo é a seguinte: Vivemos uma etapa da economia (de mercado) capitalista totalmente dominada pelos interesses financeiros. No Brasil isso é ainda mais acentuado pela forte concentração bancária de nossos sistema. Eles constituem, na verdade, o que tradicionalmente se denomina como classe dominante mas que eles preferem denominar: “Mercado”. Já não são os proprietários de terras, nem os donos das grandes empresas industriais. São donos de tudo isso e mais alguma coisa: a capacidade de movimentar o capital dinheiro (fictício) aquém e além fronteiras sem maiores limites. Muros, só para os miseráveis da África e da América Latina...Foi-se o tempo da “mais-valia”, medida pelo excesso de horas de trabalho que os operários entregavam aos empresários industriais sobre o seu custo de reprodução. Isso subsiste, sobretudo em empresas “fechadas”, mais tradicionais, de grande impacto no emprego formal mas baixa representação na valorização do PIB. Isso não é de fácil compreensão para a maior parte das pessoas que vivem mais de “impressões” sobre o que significa o processo dominação numa sociedade de classes, como a nossa. O homem simples das ruas, republicano e universal, como o dizia Cassiano Ricardo num famoso poema, vê o mundo com os olhos e ouvidos singelos sem se dar conta das camadas geológicas que formam a sociedade e controlam a opinião pública. Para ele, rico é o cara da casa mais bonita da rua de cima que tem um carro zero. Nas cidades maiores, chega a ter uma ideia de que há um seleto grupo de privilegiados donos de imóveis, estabelecimentos, membros do Rotary e suspeitos de serem massons. Dificilmente percebe que sobre a economia nacional impera um conjunto de grandes interesses financeiros que não são apenas donos do dinheiro, mas donos, através de seus investimentos, de grande parte dos ativos mobiliários – Bolsas, Dólares, Aplicações, S/As etc - , como, também imobiliários. Além de donos da “bola”, estes setores são, senão diretamente proprietários das grandes Redes de Comunicação, seus principais anunciantes e, com isso, controlam o que os diligentes leitores leem nos jornais, veem na TV e escutam nas rádios o dia inteiro. Quantos são eles? No mundo inteiro calcula-se que seja apenas 1% da população global; no Brasil, segundo o ATLAS SOCIO ECONOMICO do IPEA, bem menor: 0,01%, ou cerca de 20 mil abençoados bilionários. Alguns contestam este número e o reduzem à menos de 300 nobres famílias, metade das quais enraizada no espólio colonial. Não são pessoas más, muitos até são piedosos crentes de suas confissões e frequentam regularmente seus templos e livros sagrados. Mas têm interesses e os defendem com unhas e dentes, a propósito, afiados. Em contrapartida a este bloco de interesses se situa o interesse na Nação, com cerca de 100 mil trabalhadores ativos e 25 milhões de inativos, maioria dos quais vivendo com até 1 Salario Mínimo por mês, uma classe média em torno de 50 milhões que cresce de cima para baixo muito lentamente, e uma infinidade de brasileiros que sequer aparecem nas estatísticas procurando emprego ou recebendo alguma coisa. O interesses destes, nem sempre coincide com o interesse dos que compõem a cúpula da sociedade. Mas acabam se sensibilizando às suas causas ao serem revertidos, por vários meios, de consumidores em “investidores”, ou de trabalhadores em “empreendedores”, numa aliança de difícil reversão. De entremeio a eles, está o Governo, supostamente representativo seja da cidadania em geral, seja do Estado como entidade encarregada de preservar não só o território nacional, mas um mínimo de segurança nas suas várias acepções: Segurança Nacional, Segurança Pública e Segurança Civil, onde habitam desde o Meio Ambiente, as pessoas e as instituições. Não é muito fácil digerir isso tudo e, ao mesmo tempo, ver em que medida isso se articula com o sistema político que elege de, tempos em tempos, um Presidente da República pelo voto direto e uma Câmara dos Deputados pelo proporcional.
Ultimamente, vive-se o dilema da inflação, do dólar e do déficit público. O dito Mercado, que em nada se confunde com o mercadinho da esquina, mas o “envolve” emocional e ideologicamente, quer AUSTERIDADE DO GOVERNO e corte de gastos porque teme que o déficit se torne impagável e engula seus R$ 9 trilhões investidos em ORTN. Temem que, ao aumentar o déficit, a inflação, mais alta, também corroa o valor de sua “Poupança”. Os assalariados, claro, perdem poder de compra com a inflação. Já os titulares do “Mercado”, perdem trilhões. Até já procuram a garantia de dólares para evitar o pior mas, com isso, aumentam a corrida para a moeda mais forte elevando a taxa de câmbio, que num círculo vicioso, acabará elevando ainda mais os preços. É o dilema do sequestrador. Tendo pressionado o Governo reticente aos seus apelos, o “Mercado”, agora, aguarda o desfecho do “crime”: Uma negociação amigável. Estão todos de orelha grudada no telefone na Faria Lima, aguardando os acontecimentos. Não irão esticar ainda mais a corda. Numa dessas, o tigre acuado redobra suas forças e reverte o jogo...Aí, tudo pode acontecer, menos o nada. O dólar dificilmente voltará, no curto prazo, aos valores idílicos do passado recente.
Editoria
CARTOGAFIA CEREBRAL MADE IN INDIA
por Suzana Herculano-Houzel
Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA)
Coisas maravilhosas acontecem quando há investimento concentrado em ciência
O cérebro humano, cheio de dobras e com centenas de estruturas, bilhões de neurônios, trilhões de quilômetros de cabos e quatrilhões de sinapses, é no começo um mero canudo de células. O processo pelo qual uma coisa se transforma na outra se chama desenvolvimento, e estudar como aquele canudo vira cérebro é a única maneira de entender por que as partes do cérebro são como são.
Por que se dar ao trabalho, você pergunta? Se não lhe bastam a admiração com a ideia de que o cérebro que lhe permite ler este texto foi um dia apenas um canudo de células, mais a satisfação em pensar que entender o processo envolvido está ao nosso alcance, pense em todos os problemas de saúde que decorrem de alterações no desenvolvimento do cérebro.
A lista inclui epilepsia, autismo, deficiência intelectual, tumores e toda uma série de síndromes genéticas. Exatamente como um carro em pane, é preciso entender como o cérebro adulto é construído antes de poder sequer tentar consertá-lo.
Um mapa do cérebro humano, como um mapa de uma cidade, representa lado a lado em uma superfície plana as partes que se encontram lado a lado no mundo. Como o cérebro é tridimensional, mapeá-lo requer não um único mapa, mas uma pilha deles: um atlas. Navegar um atlas do cérebro é explorar seus caminhos.
Para acompanhar o processo de transformação do canudo em cérebro, então, é preciso ainda mais do que um atlas: é preciso toda uma série de atlas que mostrem, cada um deles, mapas de todas as células em todas as estruturas em todas as partes de cada canudo em transformação. Sem isso, sem chance de ligar os pontos e entender a lógica subjacente à complexidade daquilo que um dia começou canudo —e aliás nunca deixou de ser.
O problema é que a tarefa, monumental, é demais para laboratórios individuais e para os esquemas usuais de financiamento competitivo. Um atlas digital do cérebro humano adulto, acessível gratuitamente, foi publicado em 2016 no periódico do qual eu agora sou editora-chefe, o Journal of Comparative Neurology.
A empreitada foi possível graças à doação por Paul Allen, cofundador da Microsoft, de US$ 100 milhões em 2003, mais outros US$ 300 milhões em 2012, para o que se tornou o Allen Institute for Brain Science, em Seattle, nos EUA, um país que ainda tem tradição em investimento filantrópico em ciência.
Por isso ninguém esperava que um feito ainda maior —uma série de cinco atlas do cérebro humano durante o segundo semestre de gestação— viesse da Índia. É um país sem qualquer tradição em neurociência e que vem, como o Brasil, exportando jovens para aprender alhures —e, também como o Brasil, tentando repatriá-los já como talentos formados. Mas sem dinheiro não há ciência, e sem visão de longo prazo também não.
Eis que um engenheiro elétrico do Instituto Indiano de Tecnologia de Madras, Mohan Sivaprakasam, ousou pensar grande; o Ministério de Ciência e Tecnologia e seus consultores apoiaram e financiaram a ideia, sem qualquer processo competitivo; um ex-aluno agora bilionário doou outros tantos, garantindo a continuidade do projeto; e uma neurocientista, Richa Verma, foi repatriada da Austrália para liderar o projeto.
Dois anos e um décimo do custo do antecessor estadunidense depois, estou em Madras para anunciar a publicação pelo Sudha Golapakrishnan Brain Centre dos cinco atlas indianos no mesmo periódico, agora sob minha direção. Dá gosto de ver.
Ah se o Brasil fizesse igual...
Editorial
MAPEAMENTO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO RS- http://guayi.org.br/?p=656
A Economia Solidária é uma alternativa econômica baseada na autogestão, autonomia e solidariedade, que tem construído uma alternativa para um grande número de trabalhadores que enfrentam a crise das relações de trabalho, de desemprego e o aumento da exclusão social.
Com esta nova forma de organização do mundo do trabalho, a Secretaria Nacional da Economia Solidária – SENAES está desenvolvendo um conjunto de políticas que passou a organizar um programa voltado para o benefício dos trabalhadores da Economia Solidária.
Para planejar uma política mais efetiva de apoio, a SENAES está realizando o mapeamento da economia solidária em âmbito nacional no sentido de contribuir para a consolidação desta nova forma de economia através de um Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária. Para tanto, foram constituído um Grupo de Trabalho Nacional (GT) e 27 Equipes Gestoras Estaduais (EGEs).
No Rio Grande do Sul, a equipe Gestora – EGE, composto por DRT, UNISINOS, GUAYI, CAEPS, CAMP, CÁRITAS, COOESPERANÇA, ESCOLA 8 DE MARÇO, FURG E UNIJUÍ. vem desenvolvendo de forma articulada o mapeamento estadual, desde o segundo semestre de 2004.
A Guayí é a entidade responsável para realizar o mapeamento dos empreendimentos solidários na Região Serra e no Litoral Norte do Estado do Rio Grande do Sul, contribuindo, assim, na construção de um Sistema Nacional de Informações, constituindo um instrumento fundamental na sua visibilidade, orientando o processo de organização do movimento, identificando e subsidiando os processos de formulação de uma política econômica e a execução de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento da economia solidária.
A Guayí realizou o mapeamento de 223 empreendimentos econômicos solidários em 43 municípios da Região Serra e 21 municípios da Região Litoral Norte do Estado do Rio Grande do Sul:
Serra e Hortênsias: Bom Jesus, Cambará do Sul, Canela, Gramado, Jaquirana, Monte Alegre dos Campos, Nova Petrópolis, São Francisco de Paula, São José dos Ausentes, Vacaria, Antônio Prado, Nova Araçá, Bento Gonçalves, Nova Bassano, Boa Vista do Sul, Nova Pádua, Campestre da Serra Nova, Prata Carlos Barbosa, Nova Roma do Sul, Caxias do Sul, Parai, Coronel Pilar, Protásio Alves, Cotiporã, Santa Tereza, Fagundes Varela, São Jorge, Farroupilha, São Marcos, Flores da Cunha, São Valentim do Sul, Garibaldi, Serafina, Côrrea Guabijú, União da Serra, Guaporé, Veranópolis, Ipê, Vila Flores, Montauri, Vista Alegre do Prata Monte, Belo do Sul.
Litoral Norte: Arroio do Sal, Balneário Pinhal, Capão da Canoa, Capivari do Sul, Caará, Cidreira, Dom Pedro de Alcântara, Imbé, Itati, Mampituba, Maquine, Morrinhos do Sul, Mostardas, Osório, Palmares do Sul, Terra de Areia, Torres, Tramandaí, Três Cachoeiras, Três Forquilhas, Xangri-lá.
O mapeamento ocorre em duas fases. A primeira fase consiste na elaboração de uma listagem de empreendimentos de economia solidária através de auto-declaração na página eletrônica www.sies.mete.gov.br, declaração em formulários aplicados por uma das entidades, integrantes da EGE e a confirmação de empreendimentos pré-listados no site do Ministério de Trabalho. No Estado RS, existem 976 empreendimentos pré-listados a serem confirmados.
A segunda fase consiste na visita e aplicação de um questionário a todos os empreendimentos cadastrados na primeira fase, por parte da entidade contratada, e na alimentação do Banco de Dados do Sistema Nacional de Informações de Economia Solidária – SIES.
Os dados do mapeamento do Rio Grande do Sul estarão disponibilizados, a partir de dezembro deste ano, através de um Atlas descritivo e de um site que estará à disposição da população.
A Secretaria Nacional de Economia Solidária considera empreendimento de Economia Solidária a organização que possua as seguintes características:
São organizações coletivas (associações, cooperativas, empresas autogestionárias, grupos de produção, clubes de trocas etc.), suprafamiliares, cujos sócios/as são trabalhadores/as urbanos/as e rurais. Os que trabalham no empreendimento são, na sua quase totalidade, proprietários/as ou co-proprietários/as, exercendo a gestão coletiva das atividades e da alocação dos seus resultados.
São organizações permanentes (não são práticas eventuais). Além dos empreendimentos que já se encontram implantados, em operação, deve-se incluir empreendimentos em processo de implantação quando o grupo de participantes já estiver constituído definido sua atividade econômica.
São organizações que podem dispor ou não de registro legal, prevalecendo a existência real ou a vida regular da organização.
São organizações que realizam atividades econômicas de produção de bens, de prestação de serviços, de fundos de crédito (incluindo as cooperativas de crédito e os fundos rotativos populares administrados pelos próprios sócios/as trabalhadores/as), de comercialização (compra, venda e troca de insumos, produtos e serviços) e de consumo solidário. As atividades econômicas devem ser permanentes ou principais, ou seja, a “razão de ser” da organização.
São organizações econômicas singulares ou complexas. Ou seja, deverão ser consideradas as organizações de diferentes graus ou níveis, desde que cumpridas as características acima identificadas. As organizações econômicas complexas são as centrais de associação ou de cooperativas, complexos cooperativos, redes de empreendimentos e similares.
Editorial de sexta-feira 13
UE-Mercosul: Anatomia de um acordo colonial
Celebrado por neoliberais e governo, compromisso aprofunda desindustrialização do país, limita políticas públicas e agrava nossa condição primário-exportadora. Vale examiná-lo – e torcer para que suas contradições internas o inviabilizem
por Paulo Nogueira Batista Jr- https://outraspalavras.net/eurocentrismoemxeque/uemercosul-anatomia-de-um-acordo-colonial/
Publicado 13/12/2024 às 17:10 - Atualizado 14/12/2024 às 07:20
Imagem: Fragmento do catálogo de uma exposição de Susan Danforth Parte inferior do formulário
Acordo Mercosul/União Europeia – um post mortem
Meus amigos, os brasileiros que procuram defender o Brasil têm vida quase sempre difícil. Alcançamos, em geral, pouco ou nenhum sucesso e raramente temos algo a comemorar. Uma razão é a tenebrosa “quinta coluna”. Não sei se o leitor conhece a origem dessa expressão. Durante a Guerra Civil Espanhola, os republicanos diziam que pior do que as quatro colunas do General Franco, que marchavam sobre Madrid, era a quinta coluna franquista que operava dentro da capital. Pois bem, a nossa quinta coluna faz sombra à madrilenha. É um numeroso exército de oportunistas e vassalos de interesses estrangeiros. Dou meu testemunho: ao longo da vida inteira, passei grande parte do tempo lutando contra esses quinta-colunistas.
Veja-se, por exemplo, o recém-concluído acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Foi recebido com certa empolgação no Brasil. Celebraram, por um lado, os setores liberais e seus porta-vozes na mídia tradicional. E, por outro, os defensores incondicionais do governo, muitos dos quais pouco informados sobre o assunto. Os liberais querem expor a economia aos ventos da concorrência europeia. Os demais defensores do acordo simplesmente não admitem a hipótese de que o governo possa errar em questões fundamentais. Não são da quinta coluna, claro, mas acabam colaborando com ela sem saber.
No final do ano passado e início deste, escrevi vários artigos explicando por que este acordo, herdado do governo Bolsonaro, era uma verdadeira fria para o Brasil (Ver, por exemplo, “O Brasil não cabe no jardim da Europa”, de março deste ano). A conclusão não poderia surpreender ninguém. Afinal, o que de positivo deixou Bolsonaro?
O governo Lula obteve modificações em alguns aspectos do acordo. Embora não sejam desprezíveis, não mudam a essência neoliberal do acordo. É essa ideologia, dominante na época em que a negociação com os europeus foi lançada há duas décadas, que estabelece a orientação do acordo. O princípio da liberalização fundamenta as suas principais partes– a eliminação de tarifas sobre importações, a proibição de impostos sobre exportações e a abertura das compras governamentais a empresas estrangeiras. O pressuposto central é que a liberalização é benéfica, tão benéfica que vale a pena consagrá-la em acordo internacional, protegendo-a de decisões nacionais.
Ressalte-se que o neoliberalismo foi abandonado nesse meio tempo em quase toda parte, inclusive nos Estados Unidos e na Europa. Encontrou, porém, uma sobrevida entre nós. Como dizia Millôr Fernandes, quando ficam caquéticas, as ideologias vêm morar aqui no Brasil.
Uma curiosidade: o acordo com a União Europeia fica aquém do que seria um acordo de livre comércio para bens e serviços. Mas vai além disso em diversos outros campos, como por exemplo em compras governamentais e na proibição de tributação sobre exportações de minerais críticos.
Alterações no acordo
As alterações obtidas pelo governo Lula foram em três áreas principais: a) certa margem de manobra em compras governamentais; b) algumas exceções à proibição de taxar exportações de minerais críticos; e c) um pequeno alongamento do cronograma de desgravação tarifária no setor automobilístico.
Um ponto essencial, leitor. O que se conseguiu foi algum damage control (controle de prejuízos), e não propriamente vantagens. Esse ponto nem sempre é compreendido. Explico sucintamente.
Em compras governamentais, não temos hoje qualquer restrição à sua utilização como forma de favorecer a produção e a geração de empregos em território nacional. Temos a liberdade de definir margens de preferência para produtores nacionais nas licitações públicas, favorecendo-os relativamente a fornecedores estrangeiras. Pelo acordo com a União Europeia, fica limitado o uso desse instrumento de política desenvolvimento econômico e de política industrial. O que o governo conseguiu foi apenas introduzir exceções setoriais à liberalização. No que diz respeito a compras do Sistema Único de Saúde, agricultura familiar e pequenas empresas, por exemplo, conservou-se o direito de favorecer os produtores nacionais relativamente aos do exterior. Ou seja, limitou-se o estrago, mas a liberalização foi preservada no essencial.
No que diz respeito a minerais críticos, essenciais para áreas estratégicas como economia digital e energia, foi definida uma pequena lista de produtos sobre os quais o governo poderá estabelecer impostos de exportação até um limite de 25%. Ora, hoje o governo pode tributar exportações desses e outros produtos sem exceção e sem pedir licença a ninguém. Isso pode ser importante para garantir o nosso acesso a esses insumos e estimular que a sua elaboração seja feita em solo nacional, no lugar de exportá-los em estado bruto. Como esses minerais são decisivos para a produção em setores de vanguarda, preservar essa margem de manobra teria sido essencial. Obteve-se a título de damage control uma pequena lista sobre a qual impostos serão admissíveis até certo teto.
Quanto à eliminação de tarifas sobre bens industriais pelo Mercosul, adiou-se a redução a zero desse imposto para alguns tipos de veículos. No caso dos carros eletrificados, a eliminação das tarifas se dará em 18 anos. No caso de veículos a hidrogênio, a desgravação passa para 25 anos e para os de nova tecnologia, para 30 anos. Para os demais setores industriais, permanece o prazo original de 15 anos. Depois desse período, a indústria brasileira, com as exceções mencionadas, ficará exposta à concorrência desimpedida com a indústria europeia, que conta com acesso a fontes de financiamento e economias de escala muito mais vantajosas.
Na verdade, leitor, era impossível melhorar suficientemente o acordo fechado no tempo de Bolsonaro. Não era recomendável aceitar ponto de partida tão desfavorável para a retomada dos entendimentos com os europeus. Melhor teria sido simplesmente abandonar o acordo, como fez recentemente a Austrália em negociação semelhante com a União Europeia. E explorar outros caminhos para incrementar as relações econômicas com os europeus de forma equilibrada e mutuamente benéfica.
O que ganhamos?
Repito a pergunta que fiz nos meus artigos anteriores. O que exatamente ganhamos com esse acordo, mesmo modificado? Não estou falando em damage control, mas em vantagens concretas. Essa pergunta nunca foi respondida.
Ganhamos acesso adicional aos mercados europeus para produtos industriais? Praticamente nenhum. As tarifas europeias sobre importações industriais já são muito baixas.
Ganhamos acesso adicional para a nossa agropecuária? Pouco. O comércio desses bens em que o Mercosul é amplamente competitivo permanecerá regulado por cotas restritivas. Não é um acordo de livre comércio, portanto.
Nas áreas em que somos competitivos, prevalece o protecionismo. Só haverá livre comércio para os bens industriais em que a Alemanha e outros países têm largas vantagens competitivas. Não por acaso, a Alemanha se empenha pelo acordo. Depois de um período de transição, as tarifas de importação serão zeradas. Vamos assim exportar empregos industriais para a Alemanha. As montadoras estrangeiras, várias delas europeias, se inclinarão a produzir menos ou fechar fábricas no Brasil. Resultado: uma provável substituição de produção local por importações.
Bovinamente, os nossos representantes aceitaram negociar dentro desse esquema assimétrico…
Outra área que fica vulnerável com esse acordo é a agricultura familiar, setor para o qual não se prevê salvaguardas no processo de abertura. Não por acaso, o MST se pronunciou várias vezes contra esse acordo. O Ministério de Desenvolvimento Agrário, entretanto, parece ter ficado à margem do assunto.
Um rebanho bem comportado
Um aspecto curioso é que, mesmo sendo poucos os ganhos para a agropecuária do Mercosul, os agricultores europeus resistem ferozmente. Por isso, a França se posiciona abertamente contra a ratificação do acordo, assim como outros países com setores agrícolas vulneráveis à concorrência com o Mercosul.
Argumenta-se que o acordo não é tão ruim assim. Prova disso seria que a CNI, a Fiesp e outras entidades industriais são favoráveis a ele. Argumento falacioso. É preciso ter em conta o que realmente são essas entidades. Depois de décadas de desindustrialização, elas são industriais apenas no nome. As suas lideranças, em sua maior parte, não são empresários da indústria, mas burocratas de federações ou confederações. Ou então importadores e montadores, interessados em remoção de barreiras. Ou, ainda, filiais de empresas multinacionais, inclusive europeias, sem autonomia de decisão em relação a suas matrizes.
A verdade é que a burguesia industrial brasileira foi trucidada por décadas de políticas econômicas neoliberais, desde Collor e Fernando Henrique Cardoso. Foi-se o tempo em que havia um Antônio Ermírio de Moraes, um Cláudio Bardella, um Paulo Cunha, um José Alencar. Agora temos luminares como Paulo Skaf ou Robson de Andrade. Não sobrou quase ninguém.
Com a eliminação de tarifas sobre produtos industriais, inaugura-se provavelmente uma nova fase da desindustrialização da economia brasileira. O governo enche a boca para falar em “neoindustrialização”. Mais realista seria falar em neodesindustrialização.
Uma pequena sugestão: por que não criar uma medalha de mérito Visconde de Cairu, aquele discípulo de Adam Smith que, no início do século 19, pregava a abertura irrestrita da economia brasileira? Os negociadores desse acordo seriam os primeiros candidatos a receber essa honraria.
Realmente, como dizia Nelson Rodrigues, subdesenvolvimento não se improvisa. É obra de séculos.
Um acordo natimorto?
Termino o artigo com uma nota (envergonhada) de esperança. O que pode nos salvar dessa arapuca são alguns países europeus, notadamente a França. Ficamos nas mãos dos outros, como se colônias ainda fôssemos.
O melhor que ainda pode acontecer é a França montar uma coligação suficientemente forte, em termos de número de países e de população, capaz de constituir uma “minoria de bloqueio”. Pelas regras europeias, se houver oposição de pelo menos quatro países com pelo menos 35% da população do bloco, o acordo não passa. Mesmo que essa minoria não seja alcançada no âmbito dos poderes executivos, resta saber se os parlamentos europeus irão aprovar.
Ursula von der Leyen e Lula podem ter celebrado um acordo natimorto. O presidente Lula chegou a declarar, com notável desapego por ganhos concretos, que não era “tanto pela questão do dinheiro” que ele buscava finalizar o acordo, mas sim porque era preciso encerrar negociações que se arrastavam há mais de 20 anos…
De um diplomata que participou ativamente dessas negociações cheguei a ouvir que, embora pouco vantajoso para nós, o entendimento com os europeus teria o valor geopolítico para o Brasil de fazer um contraponto à China. É um mistério para mim que um acordo desvantajoso, que praticamente não abre mercados adicionais para as nossas exportações, possa servir como contrapeso à China, nosso maior parceiro comercial por larga margem. Não se fazem mais diplomatas como antigamente.
Essa mistura de ignorância, servilismo e desorientação estratégica nos levou a esse beco. Agora é torcer, passivamente, para que a França e outros países da União Europeia inviabilizem esse acordo danoso.
[Uma versão resumida deste artigo foi na revista Carta Capital]
EDITORIAL
Encontrando a esperança na era do ressentimento - Paul Krugman- Como o otimismo de 2000 deu lugar à raiva nos tempos atuais
The New York Times / Folha de S. Paulo - quarta-feira, 11 de dezembro/24 https://gilvanmelo.blogspot.com/2024/12/encontrando-esperanca-na-era-do.html#more
Esta é minha última coluna para o The New York Times, onde comecei a publicar minhas opiniões em janeiro de 2000. Estou me aposentando do Times, não do mundo, então ainda expressarei minhas opiniões em outros lugares. Mas esta parece uma boa ocasião para refletir sobre o que mudou nesses últimos 25 anos.
O que me impressiona, olhando para trás, é como muitas pessoas, tanto nos EUA quanto em grande parte do mundo ocidental, eram otimistas naquela época e até que ponto esse otimismo foi substituído por raiva e ressentimento.
E não estou falando apenas de integrantes da classe trabalhadora que se sentem traídos pelas elites; algumas das pessoas mais irritadas e ressentidas nos Estados Unidos agora — pessoas que parecem muito almejar ter muita influência com o governo Trump que está por vir — são bilionários que não se sentem suficientemente admirados.
É difícil transmitir o quão bem a maioria dos norte-americanos se sentia em 1999 e no início de 2000. As pesquisas mostravam um nível de satisfação com a direção do país que parece surreal nos padrões atuais. Minha percepção sobre o que aconteceu na eleição de 2000 foi que muitos americanos consideraram a paz e a prosperidade como garantidas, então votaram no cara que parecia ser mais divertido de se conviver.
Na Europa, também, as coisas pareciam estar indo bem. Em particular, a introdução do euro em 1999 foi amplamente saudada como um passo em direção a uma maior integração política e econômica — em direção a um Estados Unidos da Europa, se preferir. Alguns de nós, norte-americanos, tínhamos precauções, mas inicialmente elas não eram amplamente compartilhadas.
Claro, não era tudo flores e arco-íris. Havia, por exemplo, já um bom número de teorias da conspiração do tipo proto-QAnon e até mesmo casos de terrorismo doméstico nos Estados Unidos durante os anos Clinton. Houve crises financeiras na Ásia, que alguns de nós viam como um potencial prenúncio do que estava por vir.
Publiquei um livro em 1999 intitulado "O Retorno da Economia da Depressão", argumentando que coisas semelhantes poderiam acontecer nos EUA; lancei uma edição revisada uma década depois, quando aconteceram.
Ainda assim, as pessoas estavam bastante otimistas sobre o futuro quando comecei a escrever para este jornal.
Por que esse otimismo azedou? Como vejo, tivemos um colapso da confiança nas elites: o público não tem mais fé de que as pessoas que estão no comando sabem o que estão fazendo, ou que podemos supor que estão sendo honestas.
Não foi sempre assim. Em 2002 e 2003, aqueles de nós que argumentaram que o caso para invadir o Iraque era fundamentalmente fraudulento foram alvo de críticas de pessoas que se recusavam a acreditar que o presidente dos EUA faria tal coisa. Quem diria isso agora?
De uma maneira diferente, a crise financeira de 2008 minou qualquer fé que o público tinha de que os governos sabiam como gerenciar economias. O euro como moeda sobreviveu à crise europeia que teve o auge em 2012, levando o desemprego em alguns países a níveis da Grande Depressão, mas a confiança nos eurocratas —e a crença em um futuro europeu brilhante— não resistiu.
Não são apenas os governos que perderam a confiança da população. É surpreendente olhar para trás e ver como os bancos eram vistos de forma muito mais favorável antes da crise financeira.
E não faz muito tempo que bilionários da tecnologia eram amplamente admirados em todo o espectro político, alguns alcançando status de heróis populares. Mas agora eles e alguns de seus produtos enfrentam desilusão e pior; a Austrália até proibiu o uso de redes sociais por crianças menores de 16 anos.
O que me traz de volta ao meu ponto de que algumas das pessoas mais ressentidas na América agora parecem ser bilionários irritados.
Já vimos isso antes. Após a crise financeira de 2008, que foi amplamente (e corretamente) atribuída em parte às manobras financeiras, você poderia esperar que os antigos "Mestres do Universo" mostrassem um pouco de contrição, talvez até gratidão por terem sido resgatados. O que recebemos em vez disso foi a "raiva de Obama", fúria contra o 44º presidente dos EUA por até mesmo sugerir que Wall Street poderia ter sido parcialmente culpada pelo desastre.
Hoje em dia, há muita discussão sobre a guinada à direita de alguns bilionários da tecnologia, de Elon Musk para baixo. Eu argumentaria que não devemos pensar demais nisso, e especialmente não devemos tentar dizer que isso é de alguma forma culpa dos liberais politicamente corretos.
Basicamente, resume-se à mesquinhez dos plutocratas que costumavam se deleitar com a aprovação pública e agora estão descobrindo que todo o dinheiro do mundo não pode comprar amor.
Então, há uma saída para o lugar sombrio em que estamos? Eu acredito que, embora o ressentimento possa colocar pessoas ruins no poder, a longo prazo ele não pode mantê-las lá. Em algum momento, o público perceberá que a maioria dos políticos que criticam as elites na verdade pertencem a essa elite em todos os sentidos que importam e começará a responsabilizá-las por seu fracasso em cumprir suas promessas. E nesse ponto, o público pode estar disposto a ouvir pessoas que não tentam argumentar a partir da autoridade, não fazem promessas falsas, mas tentam dizer a verdade da melhor forma possível.
Talvez nunca recuperemos esse tipo de fé em nossos líderes —a crença de que as pessoas no poder geralmente dizem a verdade e sabem o que estão fazendo— que costumávamos ter. Nem deveríamos. Mas se enfrentarmos a kakistocracia —governo pelos piores— que está emergindo enquanto falamos, podemos eventualmente encontrar nosso caminho de volta para um mundo melhor.
EDITORIAL
Taxa Selic - Economia forte, real frágil, exterior: por que especialistas esperam novas altas dos juros
Copom deve acelerar o ritmo da alta de juros hoje/ Senado vota hoje 1º projeto de regulamentação da reforma tributária// Governo publica regras para liberar emendas e destravar pacote fiscal
Juros, novo BC e crise política - Míriam Leitão - O Globo - Conflito entre o Supremo e Congresso sobre as emendas trava votações importantes em uma semana já tensa com a alta maior dos juros
Esta última reunião do Copom do ano e da gestão de Roberto Campos Neto é a mais importante em muito tempo. O Banco Central deve acelerar de novo a alta dos juros. Um grande número de bancos e consultorias projetam uma alta de 0,75 ponto percentual na Selic, para 12%, com algumas apostas chegando a 1 ponto percentual. O clima de país em crise se espalhou entre operadores e dirigentes de instituições financeiras. Desde a última reunião, o dólar subiu de R$ 5,67 para R$ 6,08 e a inflação no acumulado de 12 meses ultrapassou o teto da meta. Com o IPCA a ser divulgado hoje, deve chegar a 4,8%, mesmo número da mediana das previsões do Focus para o ano.
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Economia vai bem ou mal? por Juremir Machado da Silva - 10 dez 24
Há perplexidade no ar. A inflação está sob controle. O desemprego está no nível mais baixo, quase de pleno emprego. O PIB está dando saltos, passando dos 3% no ano. Então, por óbvio, tudo vai bem? Não parece. O mercado está pessimista. Em certo momento do governo de Jair Bolsonaro, quando o PIB não deslanchava, o mercado estava otimista. O que está errado? Segundo o mercado, definido por Eduardo Moreira como “os mais ricos da sociedade”, as contas do governo federal. Lula e os seus estariam gastando demais. Onde cortar? Para o mercado, em qualquer lugar, inclusive nas áreas sociais, menos, claro, no pagamento dos juros da dívida pública.
O mercado se acha não ideológico, totalmente pragmático. O pragmatismo é a sua ideologia. Não lhe interessa saber em quem dói o corte de gastos, desde que não doa nos seus ganhos e interesses. Será que as queixas são uma manifestação de inveja pelos bons números do governo Lula? Não estariam os jornais soltando fogos de artifício e manchetes se fosse um governo de direita? O portal G1, em 4 de dezembro de 2024, publicou um título categórico: “Brasil atinge menor nível de pobreza e extrema pobreza da série histórica do IBGE”. Explicou: “Pesquisa mostra que 8,7 milhões de pessoas saíram da linha da pobreza no país entre 2022 e 2023 — situação que ainda atinge 59 milhões de brasileiros. No mesmo período, 3,1 milhões deixaram a extrema pobreza, condição que ainda afeta 9,5 milhões”.
Então o Brasil vai bem? Melhorou muito? O jornal conservador Estadão encontrou lugar para usar a tradicional conjunção adversativa: “Pobreza cai no País, mas 59 milhões vivem com menos de R$ 22 por dia”. O “mas” é usado sempre que não se quer elogiar demais, como quem diz, vamos dar o exato e a verdade profunda. Faz sentido. A questão, porém, é outra: melhorou ou não? Melhorou muito ou só um pouquinho? Vale rojão ou não? Recapitulando: inflação controlada, PIB subindo, desemprego baixando, pobreza caindo, nível de consumo dos mais vulneráveis também subindo. Melhorou ou não? A crer no tal mercado, não. Seria só uma ilusão. Para melhorar o governo precisa gastar menos, a taxa Selic cair muito e os ganhos dos mais ricos ficarem mais volumosos. Exagero? Distorço? Vejamos.
Três ideias não emplacam junto ao mercado nem com banda de jazz: revisar as isenções fiscais dadas pelo governo, que beneficiam grandes empresas com redução de impostos; taxar grandes fortunas; e isentar de imposto de renda os que ganham até R$ mil. Essas medidas trariam mais justiça social, ajudariam a recompor as contas do governo e aliviariam a classe média baixa de uma mordida injusta do leão. Fica valendo aquela máxima: pobre paga mais imposto do que rico. Fica-se sabendo que o mercado quer reformas desde que elas não o afetem nem reduzam suas belas tetas.
O que o Brasil mais precisa neste momento? Botar generais golpistas na cadeia, assim como seu mentor, e libertar o orçamento federal do sequestro promovido pelo parlamento. As tais emendas são pura enganação. Emendas secretas, com dinheiro público distribuído sem transparência, é só malandragem de político astuto para se dar bem sem deixar rastros incômodos. O Brasil melhorou. Pode melhorar mais. Deu um passo importante.
EDITORAL
10 DEZEMBRO: DIA DOS DIREITOS HUMANOS
DIGNIDADE do Homem como fundamento da Doutrina dos Direitos Humanos.
Oração à dignidade dos homens = Introdução às Conclusões filosóficas, cabalísticas e teológicas em 900 teses compostas por Giovanni Pico della Mirandola, aos seus 26 anos, para serem debatidas publicamente com intelectuais de toda Europa ante a Cúria romana. Florença, 1486 d.C.- Discurso sobre a Dignidade do homem - Pico della Mirandola - Livre arbítrio - YouTube
PICO DELLA MIRANDOLA
O Islã se espalhava rapidamente; no Oriente, da Arábia através do Egito e do Levante até os portões de Constantinopla, no Ocidente, através da África e Espanha até Tours. A segurança da Igreja estava ameaçada, ridicularizando sua pretensão de domínio universal, fisicamente pela tomada da Terra Santa, e metafisicamente pela introdução de idéias revigorantes no próprio coração da Cristandade. Os grandes filósofos árabes preservaram e ensinaram parcelas da tradição Platônica; os cientistas desenvolveram a astronomia, alquimia e astrologia; o esoterismo Judeu floresceu debaixo da proteção do Corão e da influência da teosofia Sufi; a expansão política Islâmica até a Índia renovou o interesse na matemática e importou os numerais hindus para o Ocidente, provendo um sistema de notação adequado para a investigação matemática avançada.
Dissensões dentro da Igreja, incluindo o deslocamento da corte papal para Avignon em 1309, e a eleição simultânea de dois 'Sumos Pontífices' quando de seu regresso a Roma em 1377, enfraqueceram a credibilidade de qualquer reivindicação de autoridade universal. Vozes corajosas como a de John Wycliffe (1320-1384) questionaram os dogmas supersticiosos - o perdão dos pecados, o poder de excumunhão e a transubstanciação - e pavimentaram o caminho para uma reconsideração racional do conceito sobre o homem, a natureza e a deidade.
A Segunda Onda encontrou sua expressão mais rica na jóia da Renascença italiana, Giovanni Pico della Mirandola (1463-1494), filho mais moço do Conde de la Mirandola e Concordia. Ele estudou nas universidades de Bolonha, Ferrara, Pádua e Paris, dominando o italiano, latim, grego, árabe, aramaico e hebreu. A reverência de Pico pela 'prisca theologia', a antiga sabedoria, atraiu-o à Academia Platônica de Florença, estabelecida por Marsilio Ficino, sob a égide e apoio de Cosimo dei Medici. Sua consciência da universalidade da verdade levou-o a rejeitar tendências humanistas tais como a ênfase no estilo oratório dentro do pensamento filosófico e a dependência exclusivamente da Grécia antiga para inspiração. Pico estudou Zoroastro e Moisés, Orfeu e Pitágoras, a teologia Cristã, a filosofia Islâmica e a Qabbalah Hebraica. Ficino traduziu Platão para o latim e Pico estudou suas obras avidamente. Quando agentes dos Medici trouxeram os escritos Herméticos para Florença, Pico incitou Ficino a traduzí-los, argumentando que eles conteriam a raiz da sabedoria e a síntese entre filosofia, ciência e religião. O próprio Pico pessoalmente trouxe a Qabbalah para o coração da Renascença.
Em 1486, com a idade de 23 anos, Pico publicou novecentas teses que seriam debatidas livremente pelos eruditos e teólogos por toda a Europa. Sete foram condenadas por Roma como heréticas, e seis outras como 'dúbias' Incluídas entre as heresias estavam as proposições de que (1) Orígenes, o condiscípulo Cristão de Plotino sob Amônio Sacas e líder da Escola Catequética de Alexandria, tendo sido excomungado por ensinar a reencarnação, deveria ser imaginado estando no céu, antes que no inferno, e (2), que a ciência da magia e da Qabbalah provam a divindade de Cristo. Ele preparou um pronunciamento aberto, 'Oratio de Hominis Dignitate' (Sobre a Dignidade do Homem), mas abandonou o projeto em face à censura papal.
A 'Oratio' de Pico tocou a nota-chave do ciclo do século XV. Ensinando que só a dialética poderia harmonizar as filosofias díspares, sintetizar ciência e religião, e desvelar o cerne de todos os sistemas, ele introduziu na Renascença o conceito de liberdade de escolha.
Na 'Oratio', Pico faz o 'mestre-construtor' dizer a Adão, o homem arquetípico:
"Eu te coloquei no centro do mundo... Nem celeste nem terrestre, nem mortal nem imortal Nós te fizemos. Tu, como um juiz indicado por ser honrado, és o modelador e fazedor de ti mesmo, podes esculpir a ti mesmo na forma que preferires. Podes descer até as naturezas inferiores que são brutas. Podes ainda ascender a partir do entendimento da alma até as mais elevadas naturezas que são divinas... É dado ao homem obter aquilo que escolhe e ser o que deseja".
Este era, dizia Pico, parte do significado por trás da simbolização do homem através de Prometeu, nos mistérios atenienses. A liberdade não negava um universo regido pela lei, mas antes depende dele. As sementes de todo tipo de vida e ser no cosmo também são inatos no homem. Se se permite crescerem as sementes da sensação, o homem se torna um bruto; se germinam as sementes racionais, ele se torna um animal celeste; mas se florescem as sementes do intelecto intuitivo, o homem se torna angélico. "E se ele não se contenta com o quinhão de uma criatura qualquer, mas o incorpora a si mesmo, à sua própria unidade, então, tornado um só espírito com Deus e estabelecido na treva solitária", o homem se torna Kutastha, "acima de todas as coisas", e "à frente de todas as coisas". Pois, "como Asaf o profeta diz: 'Sois deuses, e filhos do Altíssimo' ", e "podemos ser o que queremos".
Pico fundiu a metafísica e a ética enraizando a liberdade, a dignidade essencial do homem, na estrutura do cosmo. O método de realizar esta possibilidade divina era a meditação que acende os fogos da discriminação, da inteligência intuitiva e da compaixão - a Tríade Superior. Quem ativar estes três fogos em si, restringindo os afetos através da ciência moral, descartando as névoas da razão através da dialética e purificando a alma, se torna um serafim, um amante que "está em Deus, e mais, Deus está nele, e Deus e ele são um só".
Sabendo muito bem que não ousaria falar abertamente desta vasta concepção da deidade, ele usava a palavra 'Deus' para se referir à Treva Absoluta que está além da luz da consciência finita e também do tríplice Logos e do mestre-construtor do cosmo. O olho casual só vê as muitas referências a Deus, mas a mente intuitiva reconhecerá muitos tipos de deuses na 'Oratio'. A despeito da busca papal por heresia, este ensinamento passou impercebido por aqueles que buscavam evitar a ressurgência do pensamento.
A liberdade humana é devida ao fato de que o homem contém todos os deuses dentro de sua forma encarnada, e também tem o poder "de obter o que escolher e ser o que deseja". Na vontade, o homem é mais parecido ao impulso criativo por trás e dentro da manifestação, pois ela não tem qualidades e nenhum lugar na constituição humana. O homem não é "nem celeste nem terrestre, nem mortal nem imortal", mas se torna assim através da consciência.
A meditação e a magia são as chaves para a autotransformação. Temos uma natureza dupla que nos atrai para cima para o reinos divinos e homogêneos do ser, e também nos puxa para as esferas mais baixas e indiferenciadas de luta. "Governado pela disputa e pela discórdia como um louco, e banido para longe dos deuses, o homem é precipitado na profundeza". Mas a filosofia moral, o amor pela sabedoria dentro de um contexto de um desprendido cumprimento do dever, trará a paz. Só então podemos começar a subir a escada de Jacó "estendida desde a baixeza da terra até as alturas do céu, e dividida pela sucessão de muitos degraus". Pois "quem pode tocar a escada do Senhor com pés sujos ou mãos impuras? Como os mistérios dizem, é sacrilégio para o impuro tocar no que é puro". Mas uma vez feito, podemos cultivar um amor universal por todos os seres, e se tivermos sucesso, "subitamente incandesceremos como chamas à semelhança do serafim". Manas despertará plenamente e se unirá a Buddhi, o princípio da discriminação espiritual que, como um "trono, permanece na perenidade do julgamento". O "querubim brilha com a radiância da inteligência" e Manas Taijasi se manifesta no indivíduo.
"Se encontramos um contemplador puro, desligado do corpo, banido para os recessos mais íntimos da mente, ele não é nem terreno, nem um animal celeste; mais esplêndido, ele é uma divindade vestida de carne humana".
"Com a paz concedida pela dialética, que transcende tanto a retórica como o debate lógico, e que permite aos princípios inferiores do homem travar amizade com a Tríade Superior através de Manas, a meditação é possível.
"Quando alcançamos isso através da atuação da arte da razão, então animado por um espírito de querubim, filosofando ao longo das escarpas da escada da Natureza, e penetrando em tudo de centro para centro, em dado tempo estaremos descendo, despedaçando, como Osíris, o uno no muitos através de uma força titânica; e em outro tempo estaremos subindo e reunindo o muitos no uno, como os membros de Osíris, através de uma força Apolínea, até que o contemplador obtém a amizade que é a alma única, a amizade através da qual todas as mentes não meramente concordam em um só intelecto mas de uma forma inexprimível se tornam absolutamente unificadas".
A filosofia natural, que leva à magia, é transmitida primeiro através do estudo e depois, quando o homem todo está purificado e preparado, através da iniciação.
"Deixe que os que estão ainda impuros e necessitados de conhecimento moral vivam com as pessoas fora do tabernáculo a céu aberto, e deixe-os enquanto isso purificarem-se como os sacerdotes tessalonicences. Que aqueles que já colocaram suas vidas em ordem sejam recebidos no santuário".
Pico ensinava que a demonologia da Idade Média constituía uma degradação do Santo dos Santos e uma fascinação por potências inferiores, uma magia que levava à feitiçaria. Mas existe ainda uma magia natural mais elevada baseada na 'Sympatheion', as harmonias simpáticas ou ressonantes que ligam os espíritos da terra, as imagens celestiais e as potências verdadeiramente espirituais. Os objetos materiais não têm poder em si mesmos, embora contenham figuras astrais e akáshicas e símbolos que são potentes. Estas matrizes invisíveis podem ser levadas a um alinhamento e sintonia com a luz divina que se irradia delas difusamente, mas podem brilhar em seu esplendor pristino focalizado através do coração do Mago. "Assim o Mago casa a terra com o céu, isto é, as forças das coisas inferiores com os dons e propriedades das coisas sobrenaturais". A magia natural, usada pelo feiticeiro, é purificada e transformada passando-se para além do reino astral, até o 'plenum' supracelestial. O processo requer, além de uma perfeição moral e espiritual e vontade, um profundo conhecimento sobre as cores, números e sons como potências e relações criativas. Através deste conhecimento e prática, o homem se torna pessoalmente invulnerável no mundo e imortal na consciência, um Adepto-Mago, e quando é escalada toda a escada do ser, se torna um Mahatma, um homem divino. Daí que o mágico superior "Não faz tanto milagres, mas serve cuidadosamente a Natureza que os faz".
Devem ser cumpridos três 'Preceitos Délficos', se a pessoa há de entrar no "augusto templo da verdade, não do Apolo inventado, que ilumina toda alma que vem a este mundo". O primeiro é nada em demasia, pois o princípio da moderação em todas as coisas harmoniza a mente e o corpo de quem aspira ao conhecimento espiritual. O segundo é conhecer a si mesmo, pois a obediência "nos desperta e incita em direção ao conhecimento de toda a Natureza, da qual a natureza humana é o meio e como se fosse a união". O terceiro é Tu és, que "devemos endereçar ao verdadeiro Apolo", o Atma que paira acima de todo o ser.
Pico escreveu uma longa 'Apologia' onde defendeu suas concepções, mas foi forçado a fugir de Roma sob ameaça de perseguição pelo Papa Inocêncio VIII. Embora preso na França por Carlos VIII a pedido dos enviados papais, Pico voltou a Florença sob a proteção pessoal de Lorenzo dei Medici, e passou os últimos poucos anos de sua vida escrevendo e disseminando os ensinamentos que formam o fulcro da Renascença.
Tomando a doutrina de Orígenes, de que a escritura tem três chaves de interpretação - literal, alegórica e celestial ou oculta - Pico escreveu o 'Heptaplus', um relato da história da criação do Gênesis, sob forma de um entendimento sétuplo da evolução e da Natureza, desde os reinos elementais até os reinos supramundanos.
Em 1491 Pico renunciou ao seu título e fortuna e revelou que desejava se tornar um asceta errante e professor, assim que sua obra literária fosse completada. Ele foi completamente exonerado de qualquer acusação pelo Papa Alexandre VI, que era ele mesmo profundamente interessado em magia, mas antes que pudesse abraçar a vida de andarilho, sucumbiu de uma febre. Morreu em 17 de novembro de 1494, no dia em que Carlos VIII entrou em Florença após a expulsão de Piero dei Medici.
O espírito de sua obra deixou uma marca permanente na mente da raça, e ele mereceu, em seu sentido mais oculto, a simples denominação que deu a si mesmo: Explorador.
Embora suas obras jamais tenham sido totalmente traduzidas para a linguagem moderna, sua posição central no rensacimento do Ocidente é clara. Nas palavras de Frances Yates,
"A profunda significância de Pico della Mirandola na história da humanidade dificilmente pode ser superestimada. Ele foi o primeiro que audaciosamente formulou uma nova posição para o homem europeu, o homem como um Mago usando tanto a Magia como a Cabala para atuar sobre o mundo, para controlar seu destino através da ciência.
Editorial
Vencedores e perdedores na Síria - por MK BHADRAKUMAR
Vencedores e perdedores na Síria - Indian Punchline
Irã e Rússia são os dois grandes perdedores na deposição do presidente sírio Bashar al-Assad no domingo pelos grupos islâmicos sunitas afiliados à Al-Qaeda. Assad fugiu na hora certa após dar ordens para que houvesse uma transferência pacífica do poder. A probabilidade é que ele esteja na Rússia. De qualquer forma, uma reversão da tomada de poder islâmica na Síria está fora de questão.
As oligarquias árabes da região do Golfo estão cheias de trepidação sobre o surgimento de uma variante do islamismo político que pode potencialmente representar um desafio existencial. Sem surpresa, elas gravitaram em direção ao Irã, que veem como um fator de estabilidade regional, retribuindo o apelo de Teerã aos estados regionais para se unirem para afastar o desafio dos grupos “Takfiri” (codinome para a Al-Qaeda e o Estado Islâmico na narrativa iraniana).
Israel e Turquia são os maiores vencedores, tendo estabelecido ligações com os grupos da Al-Qaeda. Ambos estão bem posicionados para projetar poder na Síria e esculpir suas respectivas esferas de influência no território sírio. A Turquia exigiu que a Síria pertença somente ao povo sírio — um chamado mal disfarçado para férias da presença militar estrangeira (russa, americana e iraniana).
Da mesma forma, o governo Biden pode ficar satisfeito com o fato de que a presença militar russa não permanecerá descontrolada e que uma situação insustentável de perda dramática de influência cerca as bases militares de Moscou na província síria ocidental de Latakia.
Não há dúvida de que o governo "lame duck" em Washington terá prazer indireto no fato de que a presidência de Donald Trump terá que lidar com a instabilidade e as incertezas prolongadas no Oeste da Ásia, uma região rica em petróleo que gera o petrodólar, que é a base do sistema bancário ocidental — o dólar americano, em particular — e que é crucial para o eixo "América em Primeiro Lugar" das políticas externas do novo governo.
Para ter certeza, espreitando abaixo da superfície do quadro geral, há várias subtramas, algumas das quais pelo menos são de disposição contrária. Primeiro de tudo, os apelos renovados que são ouvidos em conjunto do grupo de Astana (Moscou, Teerã e Ancara) e as capitais regionais para o diálogo intra-sírio levando a um acordo negociado têm um toque de irrealidade decorrente do medo primitivo sobre a manifestação de uma variante extremista do islamismo político que a região nunca havia experimentado antes em sua história. Certamente, o clima internacional atual praticamente descarta quaisquer perspectivas de "diálogo" em um futuro previsível. Pelo contrário, toda a região provavelmente será convulsionada pelos tremores da Síria.
Os EUA devem estar satisfeitos com a mudança de regime em Damasco e darão continuidade aos esforços buscando o fechamento das bases russas na Síria. Eles declararam sua intenção de continuar com a ocupação da Síria, o que é importante se quiserem remodelar a região para atender seus interesses geopolíticos.
Segundo, a Turquia tem interesses especiais na Síria em relação ao problema curdo. O enfraquecimento do estado sírio, especialmente o aparato de segurança entrante em Damasco, fornece à Turquia, pela primeira vez, liberdade nas províncias da fronteira norte, onde grupos separatistas curdos estão operando. A presença militar e de inteligência turca na Síria se expandirá aos trancos e barrancos.
Basta dizer que a ocupação turca do território sírio pode assumir um caráter permanente e até mesmo uma quase anexação das regiões está dentro dos reinos da possibilidade. Não se engane, o Tratado de Lausanne (1923), que a Turquia considera uma humilhação nacional, acabou de expirar e chegou a hora do acerto de contas para reivindicar a glória otomana. A atual liderança turca está comprometida com a geoestratégia do neo-otomanismo.
Com toda a probabilidade, portanto, o que está em jogo é a soberania e a integridade territorial da Síria e a desintegração do país como um estado. Foi relatado que tanques israelenses cruzaram a fronteira para o sul da Síria. Sem dúvida, Israel pretende tomar muito mais do que território sírio além das Colinas de Golã. O sonho do Grande Israel deu um passo gigante em direção à realização. Em seguida, vem o Líbano, que Israel não pode deixar de aspirar a controlar se quiser ser a potência regional dominante no Levante e um influenciador na política do Mediterrâneo Oriental. De acordo com a mídia israelense, Tel Aviv tem contatos diretos com os grupos islâmicos que operam no sul da Síria. Não é segredo que esses grupos estavam sendo orientados pelo exército israelense por mais de uma década.
Assim, na melhor das hipóteses, espera-se uma Síria truncada, um estado remanescente, com a continuação da interferência externa em larga escala e, no pior cenário, o revanchismo turco e a agressão israelense juntos — mais a ocupação americana do leste da Síria e uma fraca autoridade central em Damasco — o país em sua forma atual, fundado em 1946, pode desaparecer completamente do mapa da Ásia Ocidental.
Na verdade, os estados do Golfo e o Egito têm motivos para se preocupar com uma Primavera Árabe 2.0 — oligarquias sendo derrubadas e substituídas por grupos islâmicos militantes locais refletindo a vontade do povo. Seu nível de conforto com Teerã se aprofundou perceptivelmente. Mas, é claro, os EUA vão combater essa tendência regional que, de outra forma, isolaria Israel na região.
A Rússia tem uma mentalidade notoriamente pragmática e uma declaração do Ministério das Relações Exteriores no domingo sugeriu fortemente que Moscou já está elaborando um plano B para reforçar sua presença militar na Síria no curto prazo, pelo menos. Curiosamente, a declaração destacou que Moscou está em contato com todos os grupos de oposição sírios. A declaração evitou escrupulosamente usar a palavra "terrorista", que as autoridades russas vinham usando livremente em sua retórica estridente para caracterizar os grupos sírios que tomaram Damasco. Moscou tem motivos para temer a ressonância do islamismo político como uma ideologia sedutora em suas repúblicas muçulmanas inquietas do Cáucaso do Norte.
A embaixada russa em Damasco não corre perigo algum. É inteiramente concebível que a inteligência russa, que é tradicionalmente muito ativa na Síria — por razões óbvias — já tenha começado a sensibilizar Moscou sobre uma transição de poder em Damasco estar nos planos e mantido contatos com os grupos islâmicos de oposição, apesar da retórica pública estridente.
Em comparação, o Irã sofre um sério revés do qual é difícil se recuperar em breve, pois a ascensão dos grupos sunitas extremistas que subscrevem a ideologia da Al-Qaeda levará a um novo cálculo de poder na Síria, que é visceralmente hostil a Teerã. A evacuação de diplomatas seguida pela invasão da embaixada iraniana em Damasco fala por si. De fato, Israel não poupará esforços para garantir que a influência iraniana seja exorcizada da Síria.
O cerne da questão é que a influência regional do Irã diminui significativamente à medida que os grupos de resistência (que são em grande parte xiitas) ficam sem rumo e desiludidos. Isso não só funciona em benefício de Israel, mas também desencadeia uma mudança profunda no equilíbrio de forças regionalmente, o que terá ressonância para os conflitos atuais no Grande Oriente Médio como um todo em uma perspectiva de longo prazo — Gaza, Líbano e até mesmo tão longe quanto a Ásia Central e o Sul da Ásia. O ponto principal é que o gênio da Al-Qaeda saiu da garrafa, finalmente, e não há como parar sua agenda pan-islâmica.
A parte surpreendente é que o Irã falhou em prever a reviravolta dos eventos. Incrivelmente, na sexta-feira, o conselheiro do líder supremo Ali Larijani realmente visitou Damasco e se encontrou com Assad para reiterar o apoio total de Teerã para deter a onda de forças islâmicas que já estava se aproximando dos portões da cidade.
Editorial
Dia do Trabalho Voluntário
Quando pensamos na ação voluntária, associamos imediatamente à ideia de alguém numa situação superior que vai ao encontro daquele que está numa situação vulnerável, ao carente, ao necessitado de ajuda. E é normal que pensemos assim. Pessoas que estão livres de um problema emergente ou estrutural, ajudando os que se encontram em situação difícil.
Ocorre que o ato do voluntariado é algo bem mais profundo e sensível.
Estendermos as mãos ao próximo é um ato moral que exige primeiro coragem, ou seja, disposição em se comprometer, em doar seu tempo ou seu talento, correr riscos, sem pedir nada em troca. Segundo: demonstração de solidariedade humana na defesa da vida, do meio ambiente, dos animais, do curso das atividades e interações humanas em qualquer lugar.
O brasileiro é muito solidário em situações extremas de catástrofe ambiental ou similiar. Todo mundo sai de seu conforto e se dispõe, até por alguns dias, à cooperação com autoridades da defesa civil e outros órgãos de assistência social a flagelados. Mas não está acostumado a se associar a alguma entidade de prestação de serviços voluntários permanentes, diferentemente, por exemplo, dos Estados Unidos, onde o trabalho voluntário se inclui nos currículos dos candidatos à Presidência da República. Em outros países, como no Chile, o serviço de bombeiros é voluntário, prévio treinamento dos colaboradores e associado aos profissionais do ramo. Isso dá um caráter de compromisso social diante de tragédias como incêndios e terremotos.
A data de hoje pode ser um estímulo ao voluntariado em nossa cidade. Clubes de Serviço como Rotary e Lions estão sempre com suas portas abertas para o ingresso de colaboradores. No campo ambiental a ONDA VERDE também faz diversas campanhas nas quais pede a colaboração de voluntários. A COI, junto ao prédio do Lions é outra organização aberta ao voluntariado e que presta inestimáveis serviços à população mais carente. Nossa Cultural FM é também uma organização não lucrativa, de caráter comunitário, sempre aberta à colaboração de voluntários.
Aproveite esta data e procure dar sua colaboração voluntária.
Como dizia o Presidente Kennedy: “Não se pergunte o que o Estado pode fazer por você mas o que Você pode fazer pelo Estado”. E aqui acrescentaríamos: Pelo Estado e pela Sociedade. Colabore!
Anexo
Dia Internacional do Voluntário
https://www.portalsaofrancisco.com.br/…/dia-internacional-d…
Quando pensamos na ação voluntária, associamos imediatamente à ideia de alguém numa situação superior que vai de encontro ao inferior, ao carente, ao necessitado de ajuda. E é normal que pensemos assim.
No episódio das torres gêmeas, em Nova Iorque, por exemplo, assistimos muitas pessoas auxiliando os bombeiros a tentar achar sobreviventes entre os destroços e mesmo a limpar a área atingida.
Uma imagem que nos faz pensar no que foi dito acima: pessoas que estão livres do problema em questão ajudando os que se encontram em situação difícil.
Mas acontece que o ato do voluntariado é algo bem mais profundo e sensível.
Estendermos as mãos ao próximo, ao semelhante, é um ato que exige primeiro coragem, ou seja, disposição em se comprometer, em doar seu tempo ou seu talento, segundo generosidade, que também pode ser entendida como real solidariedade, aquela que não espera nada em troca, e terceiro que enfrentemos nossa própria fraqueza.
E estar diante da própria fraqueza é admitir que, ao ajudar, queremos nos sentir melhores, curar nossas próprias feridas, superar nossas próprias limitações.
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Dia Internacional do Voluntário
05 de Dezembro
Desde 1985, a Organizações das Nações Unidas instituiu o dia 5 de dezembro como Dia Internacional do Voluntário.
O objetivo da ONU é fazer com que, ao redor do mundo, sejam promovidas ações de voluntariado em todas as esferas da sociedade.
No Brasil, já existem diversas iniciativas em favor do desenvolvimento de práticas de voluntariado.
É fundamental que cada voluntário saiba que, como ele, há milhões de pessoas no mundo dando a sua própria contribuição para o alcance das metas traçadas pelas Nações Unidas.
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Dia Internacional do Voluntário
O Voluntariado
Segundo definição das Nações Unidas, “o voluntário é o jovem ou o adulto que, devido a seu interesse pessoal e ao seu espírito cívico, dedica parte do seu tempo, sem remuneração alguma, a diversas formas de atividades, organizadas ou não, de bem estar social, ou outros campos…”
Em recente estudo realizado na Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança, definiu-se o voluntário como ator social e agente de transformação, que presta serviços não remunerados em benefício da comunidade; doando seu tempo e conhecimentos, realiza um trabalho gerado pela energia de seu impulso solidário, atendendo tanto às necessidades do próximo ou aos imperativos de uma causa, como às suas próprias motivações pessoais, sejam estas de caráter religioso, cultural, filosófico, político, emocional.
Quando nos referimos ao voluntário contemporâneo, engajado, participante e consciente, diferenciamos também o seu grau de comprometimento: ações mais permanentes, que implicam em maiores compromissos, requerem um determinado tipo de voluntário, e podem levá-lo inclusive a uma “profissionalização voluntária”; existem também ações pontuais, esporádicas, que mobilizam outro perfil de indivíduos.
Ao analisar os motivos que mobilizam em direção ao trabalho voluntário descobrem-se, entre outros, dois componentes fundamentais: o de cunho pessoal, a doação de tempo e esforço como resposta a uma inquietação interior que é levada à prática, e o social, a tomada de consciência dos problemas ao se enfrentar com a realidade, o que leva à luta por um ideal ou ao comprometimento com uma causa.
Altruísmo e solidariedade são valores morais socialmente constituídos vistos como virtude do indivíduo. Do ponto de vista religioso acredita-se que a prática do bem salva a alma; numa perspectiva social e política, pressupõe-se que a prática de tais valores zelará pela manutenção da ordem social e pelo progresso do homem.
A caridade (forte herança cultural e religiosa), reforçada pelo ideal, as crenças, os sistemas de valores, e o compromisso com determinadas causas são componentes vitais do engajamento.
Não se deve esquecer, contudo, o potencial transformador que essas atitudes representam para o crescimento interior do próprio indivíduo.
Como ser um bom voluntário
A maioria das entidades beneficentes no Brasil ainda são muito pequenas, e não têm programas de voluntariado.
Qualquer pessoa pode ser voluntária, independente do grau de escolaridade ou idade, o importante é ter boa vontade e responsabilidade.
Neste site existem mais de 4.850 entidades cadastradas, pesquise uma perto da sua casa ou trabalho, veja se a área de atuação da entidade está de acordo com a sua intenção de trabalho, e depois da escolha marque um dia para conhece-la pessoalmente.
Se não der certo com a primeira entidade, não desista, tem muita gente precisando da sua ajuda. Tente outra vez.
E se tudo der certo, ótimo! Sinta como a entidade funciona, e do que ela necessita, talvez você tenha que pesquisar um pouquinho e sugerir uma tarefa.
Por exemplo, pintar a entidade por fora ou por dentro, cadastrar doadores no computador, ajudar a organizar um evento ou fazer uma festa. A iniciativa é sua.
Seja humilde. O fato de você estar ajudando os outros não significa que você será paparicado e que seu trabalho não possa ser criticado.
O trabalho voluntário exige o mesmo grau de profissionalismo que em uma empresa, se não maior.
Existem regras a seguir, por mais meritória a causa, e não desanime se nem todos vibrarem e baterem palmas pelo seu trabalho.
Por que ser um voluntário?
A grande maioria dos voluntários no Brasil querem:
1. Ajudar a resolver parte dos problemas sociais do Brasil.
2. Sentir-se útil e valorizado.
3. Fazer algo diferente no dia a dia.
4. 54% dos jovens no Brasil querem ser voluntários, mas não sabem como começar.
Agora não tem desculpa. Pesquise as entidades perto de você e seja um voluntário.
Voluntários vivem mais e com maior saúde!
Allan Luks, em The Healing Power Of Doing Good, descobriu que pessoas que ajudam os outros têm consistentemente melhor saúde. Oito em dez dos entrevistados afirmaram que os benefícios para a saúde retornavam quando eles se lembravam da ação feita em anos anteriores.
Estudo da Universidade de Michigan constatou que homens que faziam menos trabalhos voluntários eram significantemente mais propensos a morrer.
Fonte: www.voluntarios.com.br
Dia Internacional do Voluntário
05 de Dezembro
Em 1985, a Assembleia Geral das Nações Unidas escolheu o dia 5 de dezembro como a data oficial para a celebração do trabalho voluntário.
Desde então, centenas de países aderiram à data para celebrar o esforço voluntário e suas conquistas.
Nesta data, em todos os cantos do planeta, em vilarejos e metrópoles, igrejas e associações de bairros, em escolas particulares e públicas, em praças e teatros, milhões de pessoas, instituições e organizações, empresas, governos estão desenvolvendo ações e eventos para homenagear os voluntários, que trabalham pela paz e pela melhoria da qualidade no planeta.
Há quatro anos o Brasil une-se oficialmente à celebração mundial do voluntariado. Como tem feito desde a sua criação, todo 5 de Dezembro o Programa Voluntários faz questão de enaltecer todos aqueles que dedicam parte de seu tempo, trabalho e talento para colaborar com a melhoria do lugar em que vivem.
É impressionante o aumento do reconhecimento do valor da ação voluntária. E, a cada ano, os Centros de Voluntários intensificam a programação para essas celebrações. São atividades as mais variadas possíveis, nos mais diversos lugares. As opções são tantas quantas forem as possibilidades de ações voluntárias que pudermos imaginar. Basta usar a criatividade
Alguns exemplos de ações que são realizadas no dia 5, no Brasil e no Mundo.
Atividades em parques públicos e escolas e hospitais, reuniões de confraternização entre voluntários e entidades, concertos, shows de música, espetáculos de teatro, exibição de filmes e lançamento de livros, exposições de fotos e publicações e mostras de iniciativas cidadãs
Fonte: CEDI Câmara dos Deputados
Dia Internacional do Voluntário
05 de Dezembro
A importância do trabalho de cada voluntário.
Nos bairros e comunidades, nos grupos de auto-ajuda e nos clubes, nas igrejas, nas associações culturais e esportivas, nas instituições sociais e nas empresas, um número imenso de pessoas ajudam umas às outras e ajudam a quem está em situação mais difícil.
Ao doarem sua energia e sua generosidade, os voluntários estão respondendo a um impulso humano básico: o desejo de ajudar, de colaborar, de compartilhar alegrias, de aliviar sofrimentos, de melhorar a qualidade da vida em comum. Compaixão e solidariedade, altruísmo e responsabilidade são sentimentos profundamente humanos e são também virtudes cívicas.
Ao nos preocuparmos com a sorte dos outros, ao nos mobilizarmos por causas de interesse social e comunitário, estabelecemos laços de solidariedade e confiança mútua que nos protegem em tempos de crise, que tornam a sociedade mais unida e fazem de cada um de nós um ser humano melhor.
Pelos benefícios que traz para o próprio voluntário, para as pessoas com quem o voluntário se relaciona, para a comunidade e a sociedade como um todo, é que o voluntariado merece ser valorizado, apoiado, divulgado e fortalecido.
Fonte: arquivo.portaldovoluntario.org.br
Dia Internacional do Voluntário
05 de Dezembro
A comemoração acontece em todo o mundo e visa homenagear aqueles que doam parte do seu tempo livre para a promoção do bem-estar de outras pessoas
Disponibilizar-se a ser solidário(a) com alguém ou alguma causa é motivo para comemoração.
Por isso, o mundo todo está aplaudindo as pessoas que dedicam parte do seu tempo livre para trabalhos voluntários, no dia 5 de dezembro: Dia Internacional do Voluntário.
Ser voluntário é dedicar, além de seu tempo, também seu talento para a solução de problemas enfrentados por uma pessoa, uma instituição ou, ainda, por uma causa, sem que receba qualquer tipo de remuneração por seus serviços.
O trabalho voluntário, ao mesmo tempo, é uma via de mão dupla, pois além de contribuir, o voluntário também ganha muito, como respeito, reconhecimento, conhecimentos, novos amigos, etc.
Na atualidade, o trabalho voluntário precisa estar qualificado e cada vez mais preparado, de modo a se adequar às diretrizes de cada instituição que se pretende ajudar, devendo estar, obrigatoriamente, integrado à equipe de trabalho da instituição e à sua missão.
“Ser solidário(a) faz bem a você também”
Fonte: www.grupoirmascheilla.com.br
Dia Internacional do Voluntário
O dia 05 de dezembro é o Dia Internacional dos Voluntários.
Data para homenagear todas as pessoas que por amor ao próximo, dedicam seu trabalho sem pedir nada em troca.
Lei do Voluntário
A Lei do Voluntariado, instituída em 18 de fevereiro de 1998, por decreto do Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, considera como serviço voluntário toda a atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade.
Fonte: www.iproweb.procempa.com.br
Escolha um tema para o DIV
Considere maneiras de relacionar o DIV com um problema local como a fome, a falta de atendimento médico, agressões ao meio ambiente, desastres naturais ou outras causas humanitárias. Depois de determinar um foco único com os coordenadores, desenvolva um slogan que estimule contribuições voluntárias e mobilize a população para o tema. Tenha sempre em mente que, quanto mais as pessoas se identificarem com o assunto, mais motivadas ficarão em participar.
Produza materiais promocionais
Você pode obter gráficos e informações sobre o DIV no site www.iyv.org e utilizá-los para criar posters, panfletos e calendários de atividades. Pode promover um concurso local, voltado para crianças, pedindo que bolem um cartaz sobre o que elas entendem como voluntariado ou o que esperam do DIV. Nesse caso, o cartaz vencedor será utilizado como símbolo da campanha. Esses materiais criados podem ser distribuídos em locais públicos, como bibliotecas, centros comunitários, escolas e universidades, ONGs e prédios governamentais. Procure também empresas que permitam que a divulgação seja feita entre seus funcionários.
Desenvolva uma estratégia de mídia
Crie ferramentas de mídia e planeje uma estratégia de distribuição.Busque intensificar a cobertura publicitária na semana anterior ao DIV e guarde seus melhores materiais para o dia 5 de dezembro. Estabeleça boas relações com a imprensa oferecendo-lhes sempre novas notas, artigos e fotos das atividades voluntárias que estão sendo realizadas e programadas. Deixe os jornalistas cientes de todo o planejamento para o dia 5 de dezembro. Busque o apoio de algum artista ou atleta, para que ele ajude a divulgar seus planos. Convide-o para falar sobre a importância do voluntariado. Se você conseguir alguém famoso que já tenha antecedentes de trabalho voluntário, será perfeito. Se não, tudo bem, sempre há tempo de começar.
Outras idéias de atividades que podem ser feitas no dia 5 de dezembro e que já foram sucesso em diversas cidades do mundo em anos anteriores
Voluntariado individual
Organize oportunidades para profissionais dividirem seus conhecimentos e experiências.
Realize workshops e palestras sobre temas diversos e importantes para a população.
Organize campanhas sociais sobre tópicos significativos, como prevenção ao uso de drogas, combate à AIDS, à violência, ao trabalho infantil,etcMonte um grupo e vá de casa em casa explicando aos moradores como tratar a água, aproveitar melhor os alimentos, prevenir doenças, etc
Promova apoio aos doentes através de visitas aos hospitais, campanhas de doação de medicamentos, doação de sangue, programas de vacinação, mutirões para examinar gratuitamente pessoas carentes, etc
Visite crianças em orfanatos, distribua refeições, promova um dia especial para meninos carentes com passeios e brincadeiras, colete e distribua roupas usadas e alimentos não-perecíveis,etc
Estabeleça uma linha direta para pessoas aflitas, que precisam desabafar, e lhes dê conselhos e apoio.
Voluntariado no meio ambiente
Organize mutirões para promover o reflorestamento de áreas devastadas.
Coordene eventos onde as pessoas transformem terrenos baldios em hortas comunitárias ou parques públicos.
Convide ambientalistas, agrônomos e agricultores para darem palestras sobre como cultivar hortas saudáveis e a importância de se cuidar bem da terra.
Limpe praias, rios, parques, reservas naturais, praças públicas e pode as árvores de sua cidade.
Voluntariado em comunidades ou empresas
Promova uma campanha de doação de tempo, onde os interessados destinem horas de serviço voluntário para projetos específicos.
Limpe escolas, centros comunitários, hospitais, igrejas, lugares históricos,etc.
Ajude a restaurar ou construir instituições para órfãos, menores abandonados, moradores de rua, deficientes carentes, etc.
Promova uma campanha para montar uma biblioteca, igreja, escola, posto de saúde, centro poliesportivo ou algum outro prédio que venha a ser útil para a sua comunidade.
Estimule e ajude empresas interessadas em montar um programa de voluntariado corporativo.
Fonte: almanaquedobem.com
Editorial
Editorial Cultural FM Torres RS - www.culturalfm875.com
04 de dezembro de 2016 . Morte do Poeta Ferreira
Gular, membro da Academia Brasileira de Letras.
Ferreira Gullar é poeta, crítico de arte, tradutor, memorialista e
ensaísta brasileiro. Sua poesia engajada é indispensável para a
compreensão da moderna literatura brasileira.
Publicado por: Luana Castro Alves Perez em Escritores brasileiros
https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/li…/ferreira-gullar.htm
Ferreira Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira, é um dos
nomes mais representativos da moderna literatura brasileira. Sua
extensa e diversificada produção literária e teórica fez do escritor um
dos mais importantes poetas e críticos de arte brasileiros da
atualidade. Nasceu no dia 10 de setembro de 1930 e foi no ano de
1940, em São Luís, Maranhão (sua terra natal), que teve início sua
carreira poética, cujo sucesso o conduziria a uma das cadeiras da
Academia Brasileira de Letras em 2014.
O primeiro livro de poesias, Um pouco acima do chão, foi publicado
em 1949 quando o poeta tinha apenas dezenove anos. Nessa fase,
Gullar, em período de formação, mostrou-se influenciado pelas
estéticas simbolistas e parnasianas. Posteriormente, no início da
década de 1950, escreveu os poemas de A luta corporal, livro no qual
é possível notar certa semelhança com a poesia dos poetas paulistas
que, em 1956, lançaram o Concretismo. Explorando propriedades
gráficas e vocais das palavras, rompendo com a ortografia e com as
convenções da lírica tradicional, Ferreira Gullar integrou de maneira
circunstancial o movimento concretista, do qual se afastou por causa
de discordâncias em relação às suas propostas teóricas. Abandonou
as experiências de vanguarda e engajou-se na política por meio do
Centro Popular de Cultura (CPC), grupo de intelectuais de esquerda
criado em 1961, no Rio de Janeiro, cujo objetivo era defender o
caráter coletivo e didático da obra de arte, bem como o engajamento
político do artista.
Não há vagas
O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
- porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede
nem cheira
Nessa mesma década, 1960, a poesia de Ferreira Gullar já mostrou
um estado de alta tensão psíquica e ideológica: seus textos,
independentemente dos temas abordados, são participantes, isto é,
engajados, evidenciando a preocupação do poeta com as mazelas
sociais e, sobretudo, a preocupação em contribuir para a
transformação da sociedade brasileira. Por sua intensa participação
política, foi perseguido pela Ditadura Militar e, no exílio em Buenos
Aires, escreveu Poema sujo, considerado uma obra-prima da literatura
brasileira. Gravado em uma fita cassete, o poema foi trazido para o
Brasil pelo amigo, o também poeta Vinícius de Moraes, e no ano de
1976 foi, finalmente, publicado.
Curiosamente, o reconhecimento da importância de sua obra
aconteceu apenas na década de 1990, período em que foi agraciado
com diversos prêmios e homenagens, entre os quais o Prêmio Jabuti
(o mais importante prêmio literário do Brasil), o Prêmio Machado de
Assis (oferecido pela Academia Brasileira de Letras) e o Prêmio
Camões (concedido pelos governos do Brasil e de Portugal a autores
que tenham contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário
e cultural da língua portuguesa), além de uma indicação ao Prêmio
Nobel de Literatura no ano de 2002. Paralelamente à produção
poética, Ferreira Gullar construiu uma sólida obra teórica e crítica no
campo das artes visuais, na qual reviu antigas posições
(principalmente em relação ao uso da poesia como instrumento de
conscientização social) e tratou de questões referentes à arte
contemporânea produzida no Brasil e em outros países.
O ADVENTO
O "advento" é o período de quatro semanas que antecede o Natal , iniciando-se, na tradição católica, no primeiro domingo deste interregno por missas anunciadoras deste tempo, em todos os cantos do mundo. Trata-se de um período de reflexão e espera, na expectativa da “Boa Nova” trazida pelo Natal. É um momento para que nos preparemos para a reunificação das famílias, dos homens de boa vontade e de todos os povos do mundo, sem rancores , sem preconceitos, sem outro sentimento que aquele ocupado pelo Amor. Sim, porque a grande ceia da noite de Natal não é senão um artifício para a celebração da concórdia entre todos nós. É a confirmação do Amor, que estará naquela Ceia, no momento da reunião familiar, quando centenas e até milhares de quilômetros foram tragados por ansiosos passos em direção a este encontro. -“Para onde voltamos sempre? Para casa” , se perguntava e respondia o filósofo Novallis. Pois é em casa, no amplexo familiar, que renovamos as energias afetivas para enfrentar as adversidades de um ano novo que já se anuncia. Um ritual, mas que contribui para pontualizar a monotonia do tempo e das coisas . É em casa, enfim, que a dor dói menos e a alegria é mais alegre.
O "advento" foi celebrado na Idade Média com belos cantos gregorianos, os quais que induzem à meditação e ao mistério- http://www.youtube.com/v/lfwuZaf6WXw&fs=1&source=uds&autoplay=1 . Esses belos cânticos, aliás, podem ser ouvidos na Radio Mec - www.radiomec.com.br - durante os domingos, pela manhã no mês de dezembro. E aqui fica a conclamação para que todas as Rádios, comerciais, culturais e comunitárias, façam o mesmo.
Aproveitemos, pois, o Advento, para pensar um pouco no mundo - ocidental - em que vivemos, pluri-cultural, multi-étnico, democrático, embora essencialmente cristão -, como síntese da razão helênica cevada na antiga Grécia e a fé de um homem simples que peregrinou pela Galileia e deixou, indelével, sua mensagem.
Hoje vivemos um momento difícil de nossa História. A razão e a liberdade, que pareciam sustentar a construção de um homem capaz de construir seu próprio destino, transformaram-se no seu oposto. As esperanças de um mundo melhor parecem soterradas na multiplicação sem par da miséria, na destruição do Planeta, na disseminação do vício e da depressão.
Há cem anos era outro o estado de espírito da humanidade. Havia um grande otimismo entre cientistas, políticos e artistas que faziam da capital do mundo, Paris, com sua elegante Torre Eiffel, recém construída, com suas grandes feiras industriais, com suas avenidas coalhadas de poetas e pintores, uma verdadeira consagração do mundo novo. Acreditava-se, piamente, que o Reino da Necessidade, do obscurantismo, das perseguições, estaria superado em pouco tempo.
Hoje, esse otimismo cedeu lugar à duvida, em alguns casos ao pessimismo, nos mais agudos, ao desespero. E o pior, parece que todos rumamos para esse desespero. Fomos “descontruídos” pela filosofia, pela política, pela arte, pela realidade de um mundo marcado por duas grande querras que liquidaram praticamente 100 milhões de pessoas no século passado. O sonho do progresso e de paz num planeta outrora verde transformou-se no pesadelo do holocausto nuclear. Esta decomposição pode ser vista, como já dizia o filósofo Cornelius Castoriadis, em 1993 (A Encruzilhada do Labirinto) “sobretudo, no desaparecimento das significações,no desaparecimento quase completo dos valores. E este desaparecimento é, a termo, ameaçador para a sobrevivência do próprio sistema”.
O que aconteceu...?
Não é fácil responder à esta indagação. Ela move e comove pessoas do todos os matizes religiosos e ideológicos.
Uma das principais contradições da civilização ocidental talvez seja sua obstinação em reduzir todas as suas conquistas ao Mercado, e do Mercado ao dinheiro. Numa sociedade na qual se vale pelo que se tem, onde o enriquecimento é a medida dos valores sociais e na qual o lucro se converte no objetivo último da atividade econômica, a razão se instrumentaliza a serviço dessa causa. Sobra, na margem, um pequeno espaço para a caridade cristã, para a a ação de obstinadas ONGs, quando não contaminadas por interesses espúrios de políticos inescrupulosos, para a proliferação de clubes de serviços sociais e outros afins. Mas o que é realmente levado a sério é lucratividade dos setores ditos produtivos, cujo vigor acabará determinando o nível de emprego e salário, o quantum de arrecadação de impostos e o volume do comércio em nível global. Essa razão instrumentalizada para o sacrossanto lucro empresarial é levada às últimas conseqüências e , na verdade, acaba se transformando no seu contrário: a des-razão. O que é a especulação financeira em giros meteóricos, sob o influxo da telemática e que devora países inteiros pela crise, senão uma verdadeira paranóia? Como sustentar valores morais, que estão no cerne da condição humana, como um ser capaz de pensar e erigir-se socialmente sob o império da Lei, quando um “valor mais levanta” e impõe sobre todos os demais a sua própria lei, que é a da supremacia do ter sobre o ser?
O que fizemos da liberdade conquistada, do progresso conquistado, da razão domada? Onde pusemos o ensinamento platônico de que primeiro deveríamos velar pelas virtudes, depois pela razão? Nada...
E assim, de sujeitos capazes, dotados de razão, liberdade e progresso, na rota do projeto iluminista ocidental da autonomia humana, fomos, nos degradando.
Aproveitemos, pois, o Advento, o Natal e esse momento de trégua para uma reflexão sobre nosso destino, hoje ameaçado pela iminência de um holocausto nuclear. Há tempo para tudo. Agora é hora de pensar. E pensar com coragem. Com o sentimento de que seremos imortais por esse pensar e agir. E não apenas só por orações.
* Coluna originalmente escrita por Paulo Timm em dezembro de 2009 e é adaptada, apenas, a cada ano subseqüente.
Audodepoimento – Paulo Timm
Honra-me a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, por iniciativa do Vereador Adeli Sell –PT-, hoje, com a concessão do título de CIDADÃO HONORÁRIO da Cidade. Recebo com orgulho e humildade a distinção, lembrando que por lá iniciei meu Projeto de Autonomia e afirmação pessoal, aos dez anos, em 1955, deixando, gradativamente, para trás a matriz que me havia trazido ao mundo no Rio de Janeiro, em 1944 - sob a égide do medo e da esperança como irmãos gêmeos-, e me entregado as primeiras impressões do mundo em Santa Maria, terra de meus pais. Lá tive os primeiros afetos, as primeiras letras, os primeiros verões insuportáveis numa pequena travessa, Angostura, marcada pela presença de uma sinagoga, a cadeia lateral, na rua ao lado, de onde ouviao famoso assassino do crime da mala, preso, o Ramão, atá pouco tempo antes namorado da vizinha, que me clamava pelo nome – Paulinho!!! - , um abacateiro que nunca deu fruto e maravilhosas festas de São João. Já sentia o apelo pela vivência associativa. Virei “lobinho”, primeira etapa do escotismo, da Tropa Roque Gonzalez, o que me provocou um dos grandes sustos da infância: Getúlio morrera no 24 de agosto de 54 e eu quase levo a culpa. Saíra, vestido a rigor no uniforme, com lanço vermelho ao pescoço e quase fui linchado pela turba de ferroviários getulistas enfurecidos que subiam a Avenida Rio Brancoi, confundindo-me com “maragato”. Getúlio era chimango. E , neste tempo estas rusgas regionais ainda sobreviviam.
Mas fui para Porto Alegre e aí iniciei um longo processo que hoje se completa com esta distinção como Cidadão portoalegrense. Me impressionaram na chegada a forma diferente de falar, o SULACAP, o Guaíba e o viaduto Borges de Medeiros. Aliás, foi ali sobre o viaduto que o conheci, um dia, ao andar pela Duque com minha mãe. Ela o aponta e me indica: Aquele ali o Borges de Medeiros. Um velho, no passeio matinal que por ali sempre costumava fazer. Desde então, por la passava, muitas vezes, e o olhava curioso. Ainda não sabia realmente que ele fora...Hoje sou orgulhoso de tê-lo conhecido, ainda que de vista...
Mas romper as matrizes ancestrais, não é um processo fácil. Foi um longo período de 65 anos, até agora, em que, gradualmente fui me livrando do que fora feito, em busca de uma determinação em fazer-me. Primeiro, a passagem da meninice no Alto da Bronze, para o jovem adulto. Uma figura me marcou passagem: Fulvio Petracco. Ele, mais velho, estudante de engenharia nos “enquadrou” , a todos nós, guris irresponsáveis. que passávamos as tardes aprontando à toa na esquina da Duque com a Bento Martins. Fê-lo nos organizando num grupo escoteiro de memoráveis experiências. Dali, em 1958 fui para o Julinho e vim a saber quem fora JULIO DE CASTILHOS, hoje meu ídolo político. Um novo salto. O processo de mudança do velho para o novo vem sempre com vivências e acontecimentos. O Julinho foi um ACONTECIMENTO numa época em que o país fervilhava nos Anos Douradois.
A matriz, entretanto, ainda me conduzia e acabei, por influência do pai militar na Escola de Cadetes. Foi um período duro, numa Escola de formação militar rígida, mas que me deixou a segunda impressão política que, pouco mais tarde me levaria a uma primeira ruptura: Politica. Conto isso num artigo que escrevi para o SUL 21 em 2011, aos 50 anos da Legalidade. Estava eu ainda mergulhado nos devaneios de juventude quando fomos, naquele fatídico agosto de 61, colhidos pela renúncia do Janio. O desfile militar, previsto para o dia 25 fora suspenso e estávamos “em forma”, aguardando liberação para o feriado quando fomos advertidos da gravidade da situação nacional. Naquele noite mesmo, a Escola EPPA encheu-se de oficiais detidos. Não entendíamos bem o porquê. Era o resultado das tensões que acompanhavam a conjuntura nacional, até que nosso comandante, um tal Coronel João de Deus nos comunicou que estávamos sob o comando do III Exército, acompanhando o Governador Brizola na sua luta pelo cumprimento da Constituição que determinava a posse do Vice, João Goulart. Lá fomos nós para o regime interno de prontidão. Em seguida nos deslocaram para guarda num canhão antiaéreo postado junto ao Arco da Redenção. Guardo uma foto. Mas o mais interessante aconteceria alguns dias depois, quando a situação começava a se normalizar nacionalmente e fomos dispensados, aqueles que moravam em PORTO ALEGRE, a ir em casa, mas sem tirar o uniforme de instrução: cinturão, capacete, burziguins etc. Lá fui eu, assim vestido, pegar o bonde Gasômetro, na Venâncio Aires. Não demorou, subi e nem ia sentar-me, pois o bonde estava bem cheio embora não lotado. E foi só eu colocar minha cara na entrada e o bonde irrompeu em palmas. Olhei em volta. Eram para mim. Um jovem soldado brasileiro a serviço do interesse pública, em defesa da Constituição. Experiência impagável. Guardo com emoção até hoje. Mas não entendia nada de Política. Só de reuniões dançantes....
Não durei muito na vida militar. Saí para conhecer o Brasil e passei um bom tempo viajando a e trabalhando: Rio, Paraná e Santa Catarina.. Conheci o interior destes Estados ainda em estado pioneiro. Começava a entender o BRASIL
Voltei para PORTO ALEGRE e acabei passando pela minha segunda mudança: Já adulto, morando aqui na Demétrio, me reunia com velhos e novos amigos de Santa Maria, todos altamente “politizados”, dentre ela o Joqa, da Física , e o Fábio Marenco. Anos mais tarde o Nilson, lá em ROSA DO MAR, SC, me explicaria onde tudo aconteceu: na sua casa, onde o pai, ferroviário, guardava preciosos livros “subversivos”.... Em pouco tempo e sob o impacto da ditadura, deixei pra trás mais outros elementos da minha matriz familiar. Era, agora a prefiguração da sua antítese: C O M U N I S T A. E ali começaram meus estudos sobre BRASIL e Humanas que levariam a entrar no Curso de Ciencias Sociais, junto com Economia, que já frequentava, participando ativamente do movimento estudantil da época. Vi-me, aliá, neste papel, há alguns anos numa crônica da Cidade dos anos 60, do Sergius Gonzaga. Retrata-me ele como uma espécie de comissário do povo mas ainda com sólidos ransos pequeno=burgueses. Flagrara-me ele, certa vez, indo ao alfaite, um tal Silvio, na Galeria do Rosário. Decepção total. Hoje me justifico, só em parte, porque é verdade que era muito “social”, pelo fato de que desde os 15 anos sempre mandava fazer roupas em alfaite. Sempre fui muito miúdo e não encontrava roupas do meu tamanho, a não ser no Wolens Infantil, que me constrangia. Vá o feito! Tive outra vivência que acabou me abrindo não só os olhos, mas o futuro. Começava a ver além do horizonte. E já não bastava o Partidão, mas fazia-se necessária a ruptura patrocinada pela Dissidência comandada pelo Pilla Vares, Marco Aurelio Garcia e Flavio Koutzii, que acabaria desembocando na criação do PARTIDO OPERÁRIO COMUNISTA , o POC, em 1968, onde juntou-se o que havia de melhor na militância na época. Mas já estava eu me formando em Economia e tive a grata oportunidade, sempre como resultado da vivência no universo da esquerda, de ir trabalhar na PLANISUL, onde pontificava o Prof. Accurso. Dali recolhi, não só o estimulo profissional mas a oportunidade que me ofereceram de fazer o pós graduação que me levou ao Chile, também “invenção” do Accurso. Mais um salto. Casei com a colega Maria Benetti, que logo me daria o filho Luciano e fomos para o Chile. Outra vivência notável. Lá, como experiência acadêmica, começava a ver o Brasil de fora. Me impressionva como os colegas de outros países nos viam, sempre indagando: - Como Vs. Puderam fazer tudo isso? Eu , na verdade , não via muito. Afogado pela consciência cr´tica negava tudo. Mas vale registrar uma experiência que me marcou e sempre conto aqui pro Paiva e outros economistas. Eu , por gentileza e graça do PAULO RENATO SOUZA, era o “ayudante”, espécie de monitor, do José Serra, na FLACSO, acompanhando-o nas aulas. Não ganhava muito, mas ajudava. Não tinha ainda bolsa de estudos e procurava me virar: sempre dando aula. Pois bem , um dia o SERRA me deu um artigo recém escrito para ler: Era o Mas allá del estancanmientto”, que representava, junto com a emergência do “possibilismo”, aberto pela divulgação de Gramsci no Brasil, uma reviravolta na dialética ECONOMIA X POLITICA que havia nos movido desde 64. Ou seja, podíamos pensar um projeto não revolucionário para o Brasil.
Pronto! Começava, na minha vida outro horizonte. Não meais a antítese da matriz telúrica e conservadora, mas a construção de uma visão própria de mundo. Já havia pressentido este processo quando, preparando-me para fazer o Mestrado na Sociologia da USP, graças a um amigo que lá o cursava, o ENIO SILVEIRA, que me apresentara ao então professor LUIZ PEREIRA, este me exigira compreender melhor Marx, Durkheim e Weber, cuindo de distinguir suas respectivas visões quanto á Filosofia da História, Papel do Estado e ação política, além de ma mandar além, PASMEM ! Raymond Aron. Fi-lo, sem entender bem, mas já ao final dos anos 1972, sob forte crise do Governo Allende, tudo começava a fazer sentido. Um novo sentido.
Foi aí que tive que voltar ao Brasil, com uma ruptura tembém na vida pessoal e uma nova relação com uma chilena, Maria Elena, que me daria a filha Flávia. Lé no Chile, entretanto, deixei minha casa na esperança de voltar, pois chegara a uma situação financeira deplorável.
Em Brasilia, nova vida, novo mundo, o peso de viver sob OS ANOS DE CHUMBO. Fui para o IPEA, a convite de velhos companheiros ligados à Maria da Conceição, que for minha mestra na ESCOLATINA e para a Universidade de Brasilia, aos 29 anos, como Professor colaborador , a convite de Edmar Bacha. Neste remota época , havia poucos no Brasil com nível de Mestrado, menos ainda doutorado. Fui privilegiado. E lá consegui me realizar profissionalmente como economista, inaugurando os estudos sobre ECONOMIA BRASILIENSE e definição da ESCALA REGIONAL da cidade, tal com previra Lucio Costa. Escrevi dois livros sobre a experiência, que começou pelo artigo SETE TESES EQUIVOCADAS SOBRE BRASILIA, a primeira delas dizendo que não havia planejanto algum na cidade, além do rabisco póético do Lucio Costa e que era indispensável um PLANO DE OCUPAÇÃO TERRITORIAL DO D.F., o que consegui, graçs ao apoio do então coordenador de Política Metropolitana , Jorge Francisconi. Hoje DF acomoda mais de 3 milhões de pssoas graças a este Plano., sem prejuízo da preservação do Plano Piloto, considerado Patrimônia da Humanidade pela UNESCO.
Tendo passado pelo salto ideológico em POA, pelo salto acadêmico no Chile e pelo salto profissional em Brasilia, faltava-me, entretanto um salto definitivo para a Política, vocação sempre latente, muitas vezes recusada pela prudência. Lá pelos anos 1975, me incorporei ao projeto do PARTIDO SOCIALISTA comandado por FHC e Almino Afonso. Com eles estiva muitas vezes e cheguei a receber os Estatutos / Programa para discussão. Lamentavelmente, já ao final de 77 FHC desistia do Projeto e se associava á tese da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES, aceitando uma candidatura em sublegente para o Senado de S.Paulo. Por força do destino, no outro ano eu estava em Paris, tomando um vinho no LA CUPOLLE, com Jaime Rodrigues, aqui presente, Trajano Ribeiro e Miguel Bodea, vigorosa estudioso do trabalhismo no Brasil, quando estes dois me convidam para buscar o Doutor Brizola, que lá estava chegando e que vinha à Europa discutir a recriação do PTB. Não exultei muito com o convite. Nunca tive maio aproximação com Brizola e nutria , como fruto da vivencia comunista, muitos senões frente a ele. Mas, à instâncias , lá me fui. Brizola passou uns dias em Paris, conversando com muitos brasileiros e eu, honestamente, me impressionei com sua desenvoltura, ideias arejadas e francamente socializantes. Acedi ao seu apelo e voltei ao Brasil com várias diretrizes deles quanto a contatos prometendo voltar para o já almejado ENCONTRO DOS TRABALHISTAS que se realizaria, como de fato ocorreu, em Lisboa, em 1979. Lá, então, tive minha primeira lição com o Doutor Brizola. Ao procurar dizer a ele que , lamentavelmente, de todos os contatos feitos no Brasil, nenhum acedera a ir ao Encontro para a reconstrução do PTB, pessoal de S.Paulo estava pensando num Projeto com Lula e sindicalistas, comunistas eram contra a criação de outros partidos e “autênticos” do MDB eram galvanizados pela retórica da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES, sentenciei_ : - Parece que a esquerda, Comandante, não entrará para nosso Projeto. Brizola, simplesmente , respondeu-me: - A esquerda somos nós, Timm”. E me deu as costas. Mas sem ressentimentos. Em seu retorno ao Brasil muitas vezes me convidou para assessorá-lo, no que declinei por razões familiares. Minha mulher e filhas não queriam sair de Brasilia. Logo depois, me mandou para Goiás fazer o PDT. La fiquei de 1980 a 82 e me descobriria, na verdade, mais tarde, mais poeta do que político. Reli GRANDE SERTÕES, VEREADAS, de Guimarães Rosa, e, à luz da convivência com o falar e sentir goiano do interior, o fiz meu livro de cabeceira. Como candidato a Governador, a pedido do Brizola, para efeitos de regularização do Partido e de sua candidatura no Rio, não fiz 1% dos votos, capitaneados, então polo popular IRIS REZENDE, mas iniciei-me, por inspiração de outro grande amigo, NEWTON ROSSI, no duro oficio de fazer Poemas. Ainda tenho por l pegadas e neste ano, inclusive, lá estive de novo com outro poeta JOAQUIM MONCKS semeando Casas de Poetas.
A verdade, porém, é que naquelas alturas eu já fazia meu caminho de volta para o Rio Grande. Origem e Destino. ´Nos últimos 20 anos, acompanhado pela minha jovem companheira Solange Fernandes, que me abriu também horizontes ultramarinos. Temos casa em Portugal. A filiação ao trabalhismo me deu não só um novo norte, mas um novo objeto de estudos, até ali pouco desenvolvidos. Comecei, a partir das ideias do Miguel Bodea a estudar melhor a questão da formação e funções do trabalhismo no Rio Grande do Sul e BRASIL. Faço isso desde 1980 e fui descobrindo, aqui, o sentido das lições que aprendera no Velho Verdão (Manual de Marxismo Leninismo da Academia de Ciências da URSS) , quando dava aulas a nossa turma sobre DIALÉTICA e me chamava a atenção o ponto em que la se destacava a importância da ESPECIFICIDADE DO OBJETO, ou seja, onde estamos, como somos. Aí fui redescobrindo o sentido do que o BRIZOLA falava como FIO DA HISTÓRIA. Não apenas do trabalhismo nocauteado pelo golpe de 64, mas sua raízes no republicanismo rio-grandense, na constituição desta que foi a última das colonizações, mas que teve o caráter de POVOAMENTO, lutando pela posse da terra. “Esta terra tem dono”. A linha de sucessão, enfim, era JULIO DE CASTILHOS, BORGES, VARGAS e BRIZOLA. Jango no meio, uma figura importante mas sempre de caráter mais nacional do que regional.
Valeram-me muito nesta fase os estudo do L.ROBERTO TARGA, que junto com outros pesquisadores como Giovanni Medeiros, Ondina Fachel Leal e Claudio Kniering me têm ajudar a compor o tecido da historia da formação da sociedade rio-grandense. Destes estudo, minhas espichadas para compreender melhor o papel de algumas instituições no Estado, como a BRIGADA MILITAR, motivações culturais, como o regionalismo, e sobretudo a cidade de PORTO ALEGRE, sobre a qual me debruço ainda em estudo s e pesquisas tentando comprendê-la no seu papel ao longo da nossa história. Hoje a tenho como um MODELO DE CIDADE CÍVICA . lamentavelmente sob um rótulo que a desmerece, concedido pelo Império escravocrata: Mui LEAL E VALOROSA. Ao contrário disso, PORTO ALEGRE é uma cidade transgressora, que se constitui tardiamente como cabeça política, cultural e econômica do Estado, despontando em seus ANOS DOURADOS de 45-70 como um dos mais importantes centros cosmopolitas do Brasil . Neste ETERNO RETORNO, ou como dizia um filósofo – “Para onde voltamos sempre. Para casa”, muito agradeço ao Benedito Tadeu que me “descobriu” numa remota praia do litoral catarinense, o qual me apresentou, em boa hora o Adeli Sell, Patrono desta honrosa distinção que hoje recebo. Muito obrigado!